O Reino Unido sai, mas o inglês fica

Lobbyistas irlandeses e alemães já se preparam para substituir os britânicos. E no sistema jurídico a visão anglo-saxónica pode dar lugar a uma mais românica-germânica.

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Reuters

Ninguém sabe ao certo quanto tempo demorará a negociar o processo de “divórcio”. Londres deverá invocar o Artigo 50 do tratado em Março. O chefe das negociações do lado da União Europeia, Michel Barnier, já avisou que o tempo é escasso e que o processo negocial deverá estar concluído em finais de 2018 e ser ratificado por todos no primeiro semestre de 2019, antes das eleições europeias. Se este calendário for cumprido, o Reino Unido deixará de ser membro da UE nessa altura.

Tudo vai depender das complexas negociações entre Londres e os ex-parceiros europeus, que podem atrasar-se. Mas se o “Brexit” ocorrer nesse momento, o Reino Unido já não deverá eleger os seus 73 deputados nas próximas eleições europeias.

Se assim for, o executivo britânico já não terá assento nas cimeiras, deixará de haver comissário britânico e o Reino Unido já não estará abrangido pelas obrigações europeias nem pelo Tribunal Europeu de Justiça.

O inglês, uma das 24 línguas oficiais da UE e um dos três idiomas de trabalho nas instituições europeias, não deverá ver o seu estatuto alterado. O inglês como língua franca reforçou-se nos últimos anos e fontes consultadas pelo PÚBLICO consideram que essa situação deverá manter-se nas instituições.

Além de o inglês ser língua oficial da Irlanda e de Malta (para além do irlandês e do maltês), uma mudança exige uma unanimidade improvável dos futuros 27. Mas é possível que outros países, como a França, aproveitem para reforçar o peso e a influência das respectivas línguas.  

O “Brexit” tem ainda implicações ao nível da actividade dos lobbies e a indústria de interesses em Bruxelas já está a preparar-se. Os britânicos têm uma posição dominante nesta área e Olivier Hoedeman, da Corporate Europe, que monitoriza os lobbies na capital belga, admite que as empresas possam vir a preferir lobbyistas de outros países, como os irlandeses ou alemães, com eventual acesso facilitado às instituições. “Mas as empresas britânicas não deverão perder a sua influência”, garante.

Stéphane Desselas, da agência de lobbying francesa Athenora, prevê que o “Brexit” vai ter consequências no sistema jurídico e legislativo europeu: menor influência liberal e anglo-saxónica, a favor de uma visão mais românica-germânica. E espera que haja mais recurso às empresas de consultoria francesas que “trabalham pelo menos tão bem como os britânicos”. V.G., Bruxelas

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