Bruxelas pressiona Banif a pagar ajuda estatal

A última tranche de 125 milhões do empréstimo de Cocos devia ter sido paga em Dezembro de 2014. Dificuldades na venda da seguradora Açoreana justificam incumprimento com o Estado.

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Banco liderado por Jorge Tomé Banif está em incumprimento por ter falhado o pagamento da última tranche do empréstimo de Coco´s Enric Vives Rubio

O próximo Governo terá uma pequena janela para decidir se mantém o apoio financeiro ao Banif, ou se vai exigir a devolução das verbas que recebeu no quadro do plano de recapitalização negociado em 2012. Em causa estão negociações duras com Bruxelas que alega que o Banif está em incumprimento por ter falhado o pagamento da última tranche do empréstimo de Coco´s e considera insuficiente o plano de reestruturação que lhe foi apresentado para validar a ajuda pública.

Este é um dos dossiers políticos que está na origem do diz-que-disse entre Passos Coelho e António Costa, que acusou o governo cessante de omitir informações financeiras relevantes. A suspeita justificou uma declaração da ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque, a garantir que não há “gatos” escondidos e que um dos tema abordados nos encontros entre PS e PSD/PP foi o Banif, mas que não lhe suscita preocupação. Recorde-se que, durante a campanha eleitoral, nem a Coligação Portugal à Frente, nem os partidos da oposição quiseram debater as matérias financeiras mais relevantes: capitalização do Novo Banco, da CGD e do Banif.

Mas ao contrário de dois doissers complexos, o da CGD e do Novo Banco (este está a ser resolvido dentro do calendário negociado com Bruxelas), o Banif exige decisões rápidas por estar em incumprimento com Bruxelas há quase um ano. Mas a dimensão do risco Banif, por si só, é acomodável nas contas públicas.

Em Dezembro de 2014, o banco liderado por Jorge Tomé deveria ter pago 125 milhões de euros ao Estado, o montante correspondente à última tranche do empréstimo de 400 milhões de euros de obrigações de capital contingente (CoCo´s). Deste valor, o Banif já devolveu 275 milhões. Mas as dificuldades na venda da seguradora Açoriana (com forte ligação de negócio ao Banif) e de outros activos (imobiliário que poderá estar sobrevalorizado) estão a impedir a liquidação do empréstimo.

De acordo com as normas europeias de recapitalização do sistema financeiro, a falha de pagamento tem duas soluções e ambas carecem de aval europeu: reestruturar a dívida, nomeadamente dilatando o prazo de reembolso (o que já aconteceu); transformar os Coco’s em acções (cujo número dependerá do preço de conversão e com o Estado a ter direito a um dividendo preferencial equivalente ao interesse económico). O Estado passará de credor a accionista. Esta possibilidade está em cima da mesa e, na prática, traduz-se numa estatização do banco (com nacionalização de prejuízos). Recorde-se que numa primeira fase o Tesouro chegou a ter mais de 90% do Banif, posição que foi reduzindo e que agora está em 60%. Caso haja uma transformação dos 125 milhões de euros de divida em capital, o Estado voltará a reforçar a sua presença.

O impasse à volta da execução do programa de “salvamento” junta-se à decisão da Direcção-Geral da Concorrência da União Europeia  (DGCom) de considerar insuficiente o plano de reestruturação que lhe foi apresentado pelo Banif, como contrapartida da ajuda estatal (que já foi concretizada, mas não autorizada). Um braço-de-ferro negocial que se arrasta há mais de dois anos, e cuja conclusão já devia estar concluída. As autoridades nacionais classificaram as exigências europeias de draconianas, por reduzirem a nada a instituição financeira. 

A DGCom já avisou que ou o Banif paga os 125 milhões de euros (da divida restante dos Coco’s) e aplica um programa de reestruturação validado pela União Europeia ou a ajuda do Estado (que está em 825 milhões) deve ser devolvida. 

Em Dezembro de 2012, quando o banco foi intervencionado, o Estado entrou com 1100 milhões (400 milhões de Coco’s), dos quais 700 milhões foram injectados directamente no capital, tornando-se o accionista de controlo. O acordo de capitalização do Banif prevê que o banco encontre até 2017 um investidor privado que substitua o Tesouro. Esta parte do contrato está dentro do calendário definido por Bruxelas.

Nos bastidores negociais são grandes as preocupações, sobretudo num quadro de indefinição politica com Bruxelas sem saber qual será o seu interlocutor nos próximos meses. Se o Banif não conseguir pagar ao Estado os 125 milhões, há quem sugira  a reconversão da dívida em capital, ainda que isso se traduza numa nacionalização com perdas para os accionistas que nos últimos anos, já depois da recapitalização pública, investiram no banco. Mas Bruxelas tem ameaçado a gestão e o Governo com outra solução mais agressiva e com risco sistémico: “bail-in”/fundo de resolução. 

A partir de Janeiro de 2016, entra em funcionamento a directiva comunitária que impõe que instituições sem disponibilidade para ir levantar capital ao mercado, recorram aos grandes depositantes e aos obrigacionistas detentores de dívida subordinada e sénior. Ou seja: que transformem os depósitos e as obrigações em capital. Daí a urgência em ter os três dossiers bancários (Banif, CGD e Novo Banco) negociados com Bruxelas antes do novo regime entrar em vigor. 

Fora de hipótese está para já a possibilidade do Banco Central Europeu retirar o estatuto de contraparte ao Banif dado que este tem rácios de capital nos níveis exigidos. E já este mês de Outubro de 2015, Jorge Tomé reduziu para mil milhões a exposição do Banif ao BCE que em Dezembro de 2013 estava em 3200 milhões. 

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