Presidente executivo da Volkswagen demite-se

Empresa diz que Martin Winterkorn não sabia da existência do software que falseava os testes de emissões e quer continuar a limpar a casa.

Winterkorn tem confiança reforçada
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Martin Winterkorn estava no cargo há oito anos
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Após dois pedidos de desculpas, a demissão. O presidente executivo da Volkswagen, Martin Winterkorn, despediu-se do cargo que ocupava há oito anos, embora afirmando não ter feito nada de errado.

“Estou chocado pelos acontecimentos dos últimos dias. Acima de tudo, estou surpreendido que uma falha de conduta nesta escala seja possível no Grupo Volkswagen”, escreveu Winterkorn num comunicado em que explica ter pedido a demissão ao comité executivo do conselho de supervisão do grupo. Antes do escândalo, o conselho tinha agendada para esta semana a renovação do contrato do executivo, que recentemente tinha visto reforçada a sua posição, depois de uma luta de poder interna.

O grupo não comunicou um sucessor, remetendo novidades para a reunião do conselho de consultivo desta sexta-feira. As acções da empresa, que já estavam em trajectória ascendente desde o início do dia, fecharam a sessão a valorizar 5%.

"Como CEO, aceito a responsabilidade pelas irregularidades que foram encontradas nos motores a diesel”, afirmou Winterkorn. “Estou a fazer isto no interesse da empresa, embora não reconheça qualquer atitude errada da minha parte".

Desde que foi tornado público, na sexta-feira passada, que o fabricante alemão tinha instalado software em vários modelos para enganar os testes de emissão de gases feitos nos EUA, que surgiu especulação sobre se o executivo (conhecido por prestar atenção aos pormenores de fabrico) estaria a par da fraude.

Num comunicado, o comité executivo sublinha que Winterkorn desconhecia a existência do software que enganava os testes. “O comité executivo nota que o professor doutor Winterkorn não tinha qualquer conhecimento da manipulação de dados das emissões”, lê-se na nota. 

Winterkorn parece acreditar que não deve ser o único a deixar o grupo e que a sua saída deverá dar início a esse processo. “A Volkswagen precisa de um novo arranque – também em termos de pessoal. Estou a abrir caminho para esse novo arranque com a minha demissão”.

Por seu lado, o comité executivo adiantou que são esperadas “mais consequências ao nível de pessoal nos próximos dias”. As investigações internas “estão a decorrer a grande velocidade” e “todos os participantes nestes procedimentos dos quais resultou um dano incomensurável para a Volkswagen vão ser sujeitos a todas as consequências”.

O grupo já pôs de lado 6500 milhões de euros para fazer face a custos relacionados com o caso. O comité recomendou também a criação de um “comité especial” para continuar as averiguações que a empresa está a fazer e “preparar as necessárias consequências”.

A demissão acontece no mesmo dia em que a justiça alemã avançou com um inquérito preliminar para apurar responsabilidades pela fraude e um dia após a chanceler alemã, Angela Merkel, ter exigido “completa transparência” sobre o assunto.

A actuação da Volkswagen tem levado à intervenção pública de governantes em vários países e as preocupações em relação às emissões de gases poluentes estão a estender-se também ao resto dos fabricantes.

Em França, onde o Estado subsidia a compra de carros menos poluentes, as declarações têm sido duras. Nesta quarta-feira, foi a vez da ministra da Ecologia e da Energia, Ségolène Royal, afirmar que as autoridades serão “extremamente severas” com a empresa alemã (que concorre com o grupo francês PSA, dono das marcas Peugeot e Citroën). “As vítimas são os trabalhadores cuja situação se tornou mais precária, os consumidores que foram enganados e também o estado que paga subsídios pele compra de veículos limpos”, disse.  O Governo francês já tinha pedido esta semana que fossem feitos testes a todos os fabricantes, incluindo aos franceses. Também em Espanha, onde fica a sede da Seat (que é uma subsidiária do Grupo Volkswagen), o Governo exigiu explicações à multinacional alemã.

Em Portugal, o grupo alemão é dono da fábrica Autoeuropa, uma das empresas mais exportadoras do país, o que já motivou a preocupação do Governo. "Estamos a acompanhar com atenção os desenvolvimentos deste caso, porque [a Autoeuropa] é uma unidade de produção com muita importância", disse, citado pela agência Lusa, o ministro dos negócios estrangeiros, Rui Machete, numa conferência de imprensa em Berlim. A Autoeuropa não produz nenhum dos modelos em foi instalado o software que está na origem do escândalo.

A Associação Europeia de Fabricantes de Automóveis saiu já em defesa do sector e disse não haver “indicações de que este seja um problema que atravessa a indústria”. A associação lembrou também que, em breve, as normas europeias exigirão que os testes aos veículos sejam feitos também em condições reais de condução e não apenas em laboratório, como acontece hoje.

As regras da União Europeia são substancialmente diferentes das dos EUA, onde o caso da Volkswagen foi descoberto. Naquele país, os fabricantes fazem testes aos veículos, cujos resultados são depois comparados com testes feitos pelas autoridades. Numa terceira fase, uma pequena amostra de compradores é convidada a apresentar voluntariamente o seu veículo para análise. Os limites legais para as emissões de gases poluentes são também inferiores à fasquia europeia.

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