Menos optimista sobre a economia do euro, BCE compra mais dívida

Economia da moeda única deverá crescer menos até 2017 e a inflação vai subir mais lentamente. Para conter novos riscos, BCE sobe compra de dívida de 25% para 33%.

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O conselho de governadores do BCE, liderado por Mario Draghi, reuniu-se hoje em Frankfurt RALPH ORLOWSKI/Reuters

As interrogações sobre o andamento da economia mundial deixam o Banco Central Europeu (BCE) menos optimista em relação à retoma da zona euro. A contar com um impacto negativo do abrandamento dos países emergentes nas exportações da Europa, a autoridade monetária baixou as suas previsões de crescimento da região da moeda única, descendo as estimativas de 2015, 2016 e 2017.

Mario Draghi, presidente do BCE, não escondeu os riscos que ainda vê na economia europeia e quis ao mesmo tempo dar um sinal aos mercados de que continua disposto a alargar os estímulos (através dos programas de compras de activos financeiros) de forma a conter riscos de um novo período de turbulência.

Na conferência de imprensa que se seguiu à reunião do conselho de governadores em Frankfurt, Mario Draghi anunciou que a economia do euro deverá crescer este ano 1,4%, em vez dos 1,5% previstos até aqui. Em 2016, a expectativa é agora de um crescimento de 1,7%, menos duas décimas em relação à variação anterior. E para 2017, o BCE já não espera que a economia cresça 2%, mas que avance a um ritmo de 1,8%. O BCE aponta para um abrandamento do consumo privado até 2017 e conta que as exportações também cresçam menos nos próximos dois anos (só reviu em alta os valores deste ano).

Na base desta diminuição está a baixa dos preços do petróleo, da procura mundial (que se reflecte numa menor procura pelas exportações europeias) e alguma incerteza em relação aos países emergentes, nomeadamente a China. A Alemanha tem a China como destino de 8% das suas exportações, estando mais exposta do que outras economias europeias, como a França (5%) ou a Itália (3%).

Em relação à inflação, as perspectivas também foram revistas em baixa. O BCE espera que a taxa anual seja de 0,1% em 2015, de 1,1% no próximo ano e de 1,7% em 2017. Os especialistas do BCE fizeram uma ligeira descida das suas projecções. Antes, esperavam uma trajectória mais favorável em relação ao seu objectivo de ter a inflação próxima, mas abaixo, de 2% (previam 0,3% este ano, 1,5% no próximo e 1,8% em 2017).

Draghi sublinhou que as taxas de inflação deverão continuar “muito baixas no curto prazo”, ainda que se preveja uma aceleração no final de 2015, por causa do efeito de base associado à descida do preço do petróleo no final do ano passado.

Com a melhoria da actividade económica (ainda que a um ritmo mais baixo do que o previsto anteriormente) e com a subida do preço do petróleo, o BCE espera uma recuperação da inflação nos próximos dois anos. “Esperamos que a recuperação económica continue, embora a um ritmo um pouco mais fraco do que anteriormente esperado, reflectindo sobretudo a desaceleração das economias emergentes, que estão a pesar sobre o crescimento mundial e a procura externa pelas exportações da área do euro”, afirmou Mario Draghi, falando ao lado do vice-presidente Vítor Constâncio.

Mercados aplaudem
O BCE decidiu manter inalterado o valor mensal envolvido nos programas de compra de activos financeiros – nos 60 mil milhões de euros –, optando apenas por aumentar o limite das compras de dívida de um país. Actualmente, o BCE não pode comprar mais de 25% do montante. Agora, este valor sobe para 33%.

No entanto, será feita uma avaliação caso a caso. Certo é que a Grécia continua a não reunir as condições necessárias para aceder ao programa de estímulos do BCE. “A compra de dívida não pode acontecer enquanto está em curso a revisão [de um programa de resgate”, lembrou Mario Draghi.

O presidente do BCE, que marcou um ponto de viragem na discussão da política monetária na zona euro quando no Verão de 2012, em plena agitação dos mercados sobre os países periféricos, disse que faria tudo para salvar o euro, voltou agora a admitir fazer mais para estimular a retoma económica e assegurar a estabilidade dos preços. Em aberto fica o alargamento dos programas de compras de activos financeiros. Na reunião desta quinta-feira não foi, porém, discutido um alargamento do programa, disse Draghi. “O conselho de governadores do BCE acompanhará de perto todas as informações pertinentes”, afirmou, sublinhado “a vontade, o estado de preparação e a capacidade de agir” do BCE.

Setembro é o sexto mês em que o BCE tem de pé o programa de compra de títulos de dívida pública, medida de estímulos que se veio juntar às aquisições de activos feitas pelo BCE no sector privado: a compra dos chamados instrumentos de dívida titularizada e a compra de obrigações cobertas. É a combinação destes programas que totaliza os 60 mil milhões de euros de compras por mês.

O BCE previa que os programas durariam “pelo menos” até Setembro de 2016, mas sempre deixou a porta aberta a um ajustamento do calendário, até ver uma melhoria na trajectória da inflação.

Aos governos nacionais, Draghi tem pedido que continuem a apostar em reformas estruturais – porque é daí que, diz, vem uma parte do contributo para a recuperação económica. “A procura interna deve ser ainda mais apoiada pelas nossas medidas de política monetária e o seu impacto favorável nas condições financeiras, assim como pelos progressos alcançados com [as medidas de] consolidação orçamental e as reformas estruturais”.

O compromisso de Draghi teve um impacto imediato nos mercados. As bolsas da Europa já estavam em alta, beneficiando da estabilidade nas praças asiáticas, e reforçaram os ganhos depois de o presidente do BCE falar. Os juros da dívida recuaram e o euro caiu para o valor mais baixo em duas semanas.

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