É nos países pobres que na rua se pede mais firmeza com a Grécia

Franceses divididos sobre Grexit. Três quartos pensam que há soluções para a crise que não passam pela austeridade.

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Para os franceses, a receita para a crise não passa pela austeridade François Lenoir/Reuters

O que os políticos pensam – ou pelo menos o que dizem – sobre uma eventual saída da Grécia da zona euro vai-se sabendo. Mais difícil é perceber o que pensam os povos que partilham a moeda com os gregos. Mas um punhado de testemunhos recolhidos pela AFP em vários países da moeda única parece revelar vontade de firmeza com uma Grécia que vêem como mais rica.

Um dos poucos dados concretos sobre o modo como os outros europeus do euro olham para a questão grega foi dado por uma sondagem publicada esta terça-feira pelo jornal Le Parisien. O estudo dá conta de uma claríssima divisão, com 50% a desejarem que a Grécia saia da moeda única e 49% a quererem que fique. O Grexit é defendido por 62% dos que se declaram de direita e por 32% dos que se assumem de esquerda.

Feita pelo instituto Odoxa, já depois do referendo de domingo, a sondagem indicia uma mudança de posição dos franceses, que no início de Junho tinham uma opinião claramente favorável à permanência da Grécia: 57% contra 39%.

Sem o carácter científico que uma sondagem tem, apesar das falhas nas previsões e nas margens de erro, opiniões populares avulsas recolhidas na Estónia, Letónia, Lituânia e Eslováquia são favoráveis a uma linha dura face à Grécia.

Talvez porque, observa a agência, esses países, todos com um PIB inferior ao de Portugal, tenham sofrido os efeitos de reformas duras e os seus governantes há muito argumentem que são demasiado pobres para pagar os erros de anos de governação grega.

“Ouvi dizer que alguns reformados gregos recebem mais de 1.000 euros por mês. É inaceitável. Se ganham fortunas comparadas com ao meu salário, recuso pagar as dívidas deles”, disse Martina Lelovicova, empregada de mesa em Bratislava, a capital da Eslováquia, país que aderiu ao euro em 2009 e onde o salário médio é de 880 euros.

“Se bem compreendo, o nível de vida na Grécia é mais elevado do que o nosso na Estónia. Para mim é normal as pessoas pagarem as suas dívidas”, afirma Maie Mets, reformada, 72 anos. Merit Kopli, directora do Postimees, maior jornal do país que em 2011 adoptou a moeda única, procura explicar sentimentos como o de Maie: “Os estónios não compreendem a atitude dos gregos. Temos o hábito de poupar e de viver de maneira muito sóbria.”

Na Letónia, onde o euro é a moeda desde 2014, país que em 2008-2009 sofreu uma recessão particularmente severa – que se traduziu numa quebra de 25% do PIB e cortes drásticos nos salários e pensões – as opiniões ouvidas pela AFP foram no mesmo sentido. “Não simpatizo com os gregos. Eles deviam ter começado há muito a pagar impostos. Se querem dinheiro europeu devem começar a poupar”, disse Brigita Petersone, 59 anos, empresária estabelecida em Riga, a capital.

Se nos países mais pobres a austeridade como forma de ultrapassar a crise parece ter apoio popular, em França – um dos países mais ricos do euro – a receita não passa, para a maioria, por aí. No estudo divulgado pelo Parisien, uma esmagadora maioria, 75%, entende que “há outras soluções” e só 24% a encaram como única saída para a crise da dívida grega. A rejeição da austeridade “não é unicamente de uma ‘visão de esquerda’”, escreveu Céline Bracq, directora geral do Odoxa. Entre os simpatizantes de esquerda 82% acham que há alternativas, à direita são 64%.

Quais seriam então as soluções? Para 55%, uma extensão do prazo da dívida, sem a anular. Para 22% uma anulação parcial. Para 15% uma manutenção da dívida nos valores e condições actuais. Apenas 7% defendem um perdão total. Algo que também parece distante do sentimento mais comum dos países mais pobres.

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