O dia em que Blatter vai saber se continua a ter a FIFA na mão

Apesar das revelações dos últimos dias, o suíço continua a ser o favorito nas eleições para a liderança do organismo que tutela o futebol mundial.

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Sepp Blatter fala aos congressistas no arranque do Congresso da FIFA que irá eleger o novo presidente do organismo FABRICE COFFRINI/AFP

Sepp Blatter em 2011: “Vamos colocar o navio da FIFA no rumo certo, em águas transparentes. Vamos precisar de algum tempo, não o podemos fazer de um dia para o outro, mas a nossa pirâmide está intacta porque a fundação é sólida.” Sepp Blatter em 2015: “Não pode haver corrupção de nenhum tipo. Que este seja o ponto de viragem. Tem de ser feito mais para assegurar que toda a gente no futebol se comporte de forma responsável e ética.” Diferenças de discurso? Há quatro anos, Blatter utilizou uma metáfora náutica, mas o tom era o mesmo, o de que a FIFA precisa de reformas. Hoje irá saber-se se Blatter vai, ou não, suceder a Blatter no cargo que ocupa há 17 anos. Antes de quarta-feira, todas as apostas iam para o suíço. Depois da detenção de actuais e antigos dirigentes da FIFA por acusações de corrupção, nem tanto.

Blatter concorre a um quinto mandato para gerir os destinos do futebol mundial e, ao contrário do que aconteceu em 2007 e 2011, vai ter concorrência, o príncipe de Jordânia Ali bin al Hussein, o único adversário do suíço que se mantém na corrida depois das desistências do holandês Michael van Praag e do português Luís Figo. Se antes das detenções Blatter tinha na mão uma vitória esmagadora à primeira volta, em que são precisos dois terços dos votos das 209 federações filiadas, os dados disponíveis apontam como provável a necessidade de uma segunda volta, onde bastará uma maioria simples para um dos candidatos ser o vencedor.

Na contagem de espingardas, Blatter, de 79 anos, só não tem o apoio declarado da UEFA. Na abertura do congresso, em Zurique, Michel Platini, o líder do futebol europeu, pediu ao suíço que abandonasse a corrida e o consenso entre quase todas as federações europeias era de que as eleições deviam ser adiadas. Ainda assim, a UEFA decidiu não boicotar as eleições, com o argumento de que tal só iria facilitar a vitória de Blatter, e a maioria dos seus 53 votos irá para Hussein, de 39 anos, menos de metade da idade de Blatter – as excepções conhecidas são a Espanha e a Rússia.

De resto, Blatter estará a contar com os votos da Confederação Africana (54) e terá boa parte dos países asiáticos (46), para além de contar com a maioria ou totalidade dos votos na Oceânia (11), América do Sul (10) e América do Norte, Central e Caraíbas (35). Fonte ligada à candidatura do príncipe jordano garante, no entanto, que, para além dos votos europeus, tem garantidos pelo menos mais 60 votos entre as outras confederações, o que garantiria, pelo menos, uma segunda volta, algo que Blatter nunca enfrentou – podia ter acontecido em 1998, com uma votação renhida no primeiro escrutínio, mas Lennart Johannson, o candidato derrotado, não quis continuar na corrida.

Se Blatter fala da necessidade de reformas para um organismo que liderou durante 17 anos (e ao qual está ligado há 40), Hussein concorre com a mesma ideia, mas, claro, sem Blatter por perto. No caso de uma vitória deste membro da família real jordana, ele será o primeiro presidente asiático da história da FIFA e interrompe o terceiro reinado mais longo nos destinos do organismo. Mas tempo que Blatter, só o brasileiro João Havelange (24 anos, entre 1974 e 1998) e Jules Rimet (33, entre 1921 e 1954).

“A FIFA precisa de liderança que dirija, oriente e proteja as federações nacionais. Liderança que aceite a responsabilidade pelas suas acções e não sacuda as culpas. Liderança que restabeleça a confiança de centenas de milhões de adeptos de futebol em todo o mundo”, afirmava Hussein, o vice-presidente asiático da FIFA, após terem sido conhecidas as detenções. Hoje se saberá se Blatter, que tem cultivado a lealdade dos dirigentes do futebol mundial com uma espécie de distribuição de dividendos, continua a ter a FIFA na mão.

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