Um "português dos quatro costados" fala das "arritmias da nossa auto-estima"

Rodeado de personalidades do PSD, Durão Barroso defendeu que só uma "governação mundial" pode resolver ameaças como a instabilidade financeira, o terrorismo e as pandemias.

Foto
Durão Barroso Nuno Ferreira santos

Os quatro sofás no palco da Aula Magna do Instituto de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) estão ocupados por quatro homens. Todos eles foram, a seu tempo, deputados do PSD. O mais efémero de todos é o director do Instituto, Manuel Meirinho Martins, que saiu 10 meses depois de iniciada a actual legislatura. A seu lado, Costa Neves, que foi ministro de Durão Barroso. Na ponta oposta, Carlos Pimenta que foi secretário de Estado, deputado e eurodeputado. E a seu lado, José Manuel Durão Barroso, o convidado de honra da sessão, que liderou a Comissão Europeia até ao ano passado.

O tema da conferência deixa poucos assuntos de fora: "Portugal, a Europa e o Mundo." O ISCSP da Universidade de Lisboa e a Plataforma Para o Crescimento Sustentável lançaram o tema. Durão usou-o para passar algumas mensagens. Pôs o país no divã e ditou um diagnóstico: "Arritmias da nossa auto-estima", ou seja, "oscilações de humor" motivadas por uma "mitologia em relação ao passado". Para Durão, "Portugal não é um país pequeno". 

Os últimos anos "foram um teste à convicção europeia de Portugal". A crise, "erradamente designada por crise do euro", motivou algum eurocepticismo, que Durão apontou sobretudo à esquerda (por várias vezes saudou o facto de não haver no país extrema-direita).

Mas as causas da crise não devem ser procuradas no exterior, exige o ex-primeiro-ministro. "Foi fácil desculpabilizar o país". Mais difícil é "ser-se europeísta quando se têm de tomar medidas difíceis". Ainda assim, assegura,  há "resiliência" no meio de tanta arritmia: "Os portugueses são um povo com capacidade para aguentar situações difíceis." E isso, assegura, "é positivo".

A UE, "percursora do governo mundial", é o que permite a todos - pequenos, médios e grandes - "discutir em pé de igualdade com os EUA e a China". E a ideia de "governação mundial", avança Durão, é a única capaz de enfrentar as "ameaças" que pairam sobre o futuro, "como a instabilidade financeira, a ameaça terrorista e as pandemias".

Depois da sua intervenção, Durão disponibilizou-se para responder ao público que encheu a Aula Magna Adriano Moreira do ISCSP (havia um ecrã no exterior onde uma dezena de alunos que não conseguiram lugar na sala assistiam à conferência). Como é hábito, nestas ocasiões, as perguntas reflectem o interesse, mais do que a curiosidade, de quem as faz.

Por isso, houve perguntas sobre "economia azul", demografia, empresas high-tech, Tratado Transatlântico de Comércio UE-EUA... Durão defendeu o criticado TTIP: "Tive a honra de ter lançado o TTIP." Foi consensual na demografia: "Uma gestão adequada e prudente da imigração e políticas públicas podem ajudar a resolver o problema." Equilibrou-se numa difícil defesa do "sim" no referendo britânico sobre a continuação na UE ao mesmo tempo que elogiou David Cameron, o homem que prometeu, e convocou, o tal referendo. Durão chegou a usar o adjectivo "perigoso" para qualificar o referendo, mas depois de um reparo de um presente, João Ralha, corrigiu, afirmando que "perigoso é o resultado, um referendo é um modo legítimo de um povo exprimir a sua opinião.

Este "português dos quatro costados", como anunciou Costa Neves, só tem reparos a fazer ao governo grego, que acusa de ter "uma posição muito ideologicamente marcada". Uma saída da Grécia do euro agora "é gerível, mas é um precedente mau", afirmou.

Quando terminou a sessão, José Luís Arnaut, ex-ministro adjunto de Durão, conselheiro da Goldman Sachs, foi dos últimos a sair, depois de cumprimentar o seu amigo e correligionário que agora dá aulas em Princeton, nos EUA, mas ainda não se reformou da política. Na próxima semana, confidenciou, vai estar em Bruxelas, para "consultas informais" sobre política internacional.

Sugerir correcção
Ler 6 comentários