Draghi: reformas são urgentes para evitar recuo do crescimento potencial

A falar em Sintra, presidente do BCE destacou Portugal como um país em que foram feitos progressos nas reformas estruturais.

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Mario Draghi não quis deixar dúvidas sobre a importância que o Banco Central Europeu (BCE) dá às reformas estruturais. Depois de começar o seu discurso, dizendo que os responsáveis do BCE usam o termo “reformas estruturais” em um terço de todas as suas intervenções, contra apenas 2% dos responsáveis da Reserva Federal, o presidente da autoridade monetária europeia escolheu usar a totalidade da sua intervenção para explicar por que é que, principalmente para os países da zona euro, pôr em prática reformas estruturais é tão importante.

A falar na abertura do segundo dia do Fórum que o BCE está a realizar na Penha Longa, em Sintra, Draghi defendeu que o facto de as economias estarem neste momento numa fase inicial da recuperação económica não é uma causa para abrandar as reformas. “Pelo contrário, é uma oportunidade para as acelerar”, disse.

E, alertando para o facto de o crescimento potencial na Europa estar a subir, mas para níveis inferiores a antes da crise, reforçou a ideia de que é urgente os Governos aplicarem políticas que tornem os mercados de trabalho e de produto mais flexíveis e eficientes, estimulando assim o crescimento. “Na zona euro, o efeito das reformas estruturais seria muito significativo no crescimento potencial”, disse, dando como exemplos positivos recentes a Espanha e a Itália. “Quanto mais cedo forem feitas, melhor”, defendeu.

Mario Draghi reconheceu que pode haver o risco de algum tipo de reformas estruturais poder ter efeitos negativos do lado da procura no curto prazo. No entanto, recusou a ideia de que tal se aplique a todas as reformas estruturais. O presidente do BCE defendeu que “se forem bem desenhadas as reformas podem ter um efeito neutro na procura” e um efeito de médio e longo prazo positivo do lado da oferta.

Repetindo aquilo que tem dito desde que o BCE intensificou o seu programa de compra de activos na zona euro, Draghi disse que “é incorrecto o argumento de que uma política monetária expansionista constitui uma desculpa para os governos e os parlamentos adiarem os seus esforços de reforma”. Pelo contrário, disse, a acção do BCE “torna as reformas menos penalizadoras do ponto de vista político e social, uma vez que reduz o tempo que é preciso para que as reformas comecem a produzir resultados”.

A falar em Sintra, Mario Draghi fez, sobre este tema, uma referência a Portugal. O presidente do BCE fez questão de dizer que não sentia que a importância que o banco dá às reformas estruturais tem sido ignorada pelos países, afirmando que “pelo contrário, muito tem sido atingido e temos elogiado os progressos onde eles são atingidos, incluindo aqui em Portugal”.

É mesmo tarefa do BCE?
O apelo do BCE a que os Governos façam reformas estruturais (algo que está longe de ser uma novidade) acabou por ser depois motivo de discussão no resto do Fórum. E se é verdade que vários dos intervenientes concordaram com a ideia de que a Europa precisa de realizar reformas para aumentar o potencial de crescimento da economia, também houve quem colocasse em causa as vantagens de um banco central estar a fazer recomendações que vão para além do seu mandato, que é o da estabilidade de preços.

Willem Buiter, economista chefe no Citigroup foi o primeiro, dizendo que o BCE “está a interferir muito mais nestas questões do que seria desejável”, já que pode acabar por ter efeitos contraproducentes na sua independência. Lembrou também que “a Reserva Federal norte-americana é muito mais discreta nesta matéria”.

Logo a seguir, o economista belga Paul de Grauwe acentuou as críticas. “Porque é que há esta rigidez estrutural na Europa? Porque as pessoas querem. As pessoas querem salários mínimos e não querem idades de reforma mais altas”, afirmou, defendendo que o BCE tem de aplicar a sua política monetária no contexto daquilo que é escolhido de forma democrática.

Larry Summers, ex-secretário do tesouro dos EUA concordou, dizendo que é difícil um banco central interferir sobre questões como a idade da reforma, sem que depois as pessoas não sintam que têm o direito de interferir na taxa de juro que pagam pelos empréstimos.

A finalizar, Stanley Fischer, vice presidente da Fed, explicou porque é que a autoridade monetária norte-americana é mais discreta na hora de fazer recomendações ao Governo. “É melhor não pisar os pés dos outros, se não queremos que nos pisem a nós”, disse.

Em defesa do papel que tem vindo a ser desempenhado pelo BCE, o economista do think tank Bruegel, André Sapir, disse que “é importante que se avise os cidadãos quando existem inconsistências nas políticas que estão a ser seguidas”. E acrescentou: “É certo que as pessoas querem determinadas coisas, mas a verdade é que também quiseram ter o euro”.

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