A princesa que queria ser humana

Depois de Miyazaki, um novo exemplo máximo do artesanato zen da animação japonesa, numa belíssima e arrebatadora miniatura sobre o que nos faz humanos.

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Se Hayao Miyazaki continua a ser visto internacionalmente como o “mestre” da animação japonesa contemporânea, o seu cúmplice (e associado no Studio Ghibli) Isao Takahata tem sido injustamente relegado para um “segundo plano” que em nada lhe fica atrás.

Autor de O Túmulo dos Pirilampos (1988), considerado uma das obras-primas absolutas do cinema de animação moderno, Takahata esteve 15 anos a trabalhar neste Conto da Princesa Kaguya – desde já um dos mais belos filmes que vamos poder ver em sala este ano, cuja delicadeza de toque e deslumbre visual o faz transcender a mera dimensão de conto de fadas oriental que lhe está na origem.

Exemplo máximo do artesanato gráfico do estúdio Ghibli, O Conto da Princesa Kaguya explora um traço suave e livre sobreposto a uma sucessão de delicados fundos aguarelados, de uma economia visual sugestiva e inspirada, para contar a história de uma menina magicamente enviada a um pobre cortador de bambu e à sua mulher, que tudo fazem para lhe dar a educação de princesa que o seu estatuto sobrenatural lhe parece atribuir. É uma história de aprendizagem que prolonga a tradicional concepção zen da necessidade de um constante equilíbrio com o mundo natural, ao mesmo tempo que, de modo quase imperceptível, explica as alegrias e as tristezas de se ser humano através das experiências da princesinha. Dito desta maneira, parece um filme para miúdos – e certamente que também o é – mas a prova maior da excelência de Takahata é que O Conto da Princesa Kaguya não é “apenas” um conto de fadas animado: é, sobretudo, uma miniatura de arrebatadora simplicidade sobre o que nos faz humanos contada com poesia benévola, como se o cineasta japonês nos enfeitiçasse durante quase duas horas e meia nas quais nada está a mais nem a menos.

É, apenas, um enorme, grandíssimo filme que deveríamos saber receber com o respeito que merece.


 

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