O BES em bocados

Os grandes trabalhos jornalísticos, mais do que revelar verdades, levantam dúvidas.

Não é raro, mas sabe sempre bem ver a imprensa a fazer melhor aquilo que a Internet teima em fazer para conseguir cada vez mais cliques: listas numeradas com muitos números pelo meio.

No PÚBLICO de anteontem Cristina Ferreira e Paulo Pena serviram duas páginas acesas e abençoadamente ininterruptas (não era preciso qualquer clique para passar de um item para outro) sobre o caso BES, deliciosamente editado.

Se, tal como eu, não seguiu o caso BES, o trabalho destes meus dois colegas é um poupa-tempo tão divertido e relaxante como o melhor passatempo – e muito, muito mais valioso. 

O grafismo é brilhante, tal como o material. Há, ao mesmo tempo, rigor quantitativo e sentido de humor. Que melhor combinação há no jornalismo do que a informação aliada à alegria?

Zeinal Bava é felicitado "por [trazer] para a comissão uma muleta de linguagem: 'Não guardo na memória'". O corajoso Carlos Abreu Amorim, do PSD, que desde já abraço por ter chegado à mesma conclusão que eu, é realçado por confessar: "Já não sou um liberal. O Estado tem de ter força." Eu preferiria uma fórmula menos mussoliniana, como, porventura: "Por ser um liberal, precisamente, percebo que o Estado tem de ter força; nem que seja para proteger as liberdades e para compensar os resultados injustos das mesmas."

A segunda página é dedicada, majestaticamente, a "Quem falta ouvir". Precisamente. Os grandes trabalhos jornalísticos, mais do que revelar verdades, levantam dúvidas.

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