O México prendeu o narcotraficante La Tuta, o seu inimigo nº1

A detenção do líder dos Caballeros Templarios é uma importante vitória política para o Presidente Peña Nieto

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Polícia junto ao local onde Servando Gómez Martínez esteve a ser interrogado na Cidade do México Edgard Garrido/Reuters
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"La Tuta", um professor que se tornou traficante DR

As autoridades mexicanas anunciaram, com pompa e circunstância, a captura de Servando Gómez Martínez ou La Tuta, o líder do cartel dos Caballeros Templarios e inimigo público número um, responsável pela transformação do estado de Michoácan e da chamada Tierra Caliente mexicana numa zona de guerra e terror.

A detenção de La Tuta, o homem mais procurado no país e que se entregou à polícia federal sem que fosse disparado um tiro, relegou para segundo plano a outra notícia “sensacional” do dia: a saída de cena do procurador-geral Jesús Murillo Karam, a quem coube a ingrata tarefa de confirmar aos mexicanos que os 43 estudantes desaparecidos na pequena cidade de Iguala, em Setembro, tinham sido massacrados por um dos grupos do narcotráfico do estado de Guerrero – e assim tornar-se o rosto do fracasso na luta contra os cartéis da droga.

A substituição do procurador, depois de meses de contestação, pode ser entendida como um sinal de cedência do Governo de Enrique Peña Nieto perante a pressão da opinião pública, e ao mesmo tempo como uma prova de que o Presidente pretende mostrar que não está resignado e quer recuperar a iniciativa, assinalavam os analistas.

Na cadeia institucional, Murillo Karam era o elo mais fraco: o seu infeliz desabafo no final de uma tensa conferência de imprensa sobre o caso dos normalistas – “Cansei-me” – fora recuperado como a palavra de ordem dos protestos anti-governamentais. “Cansamo-nos da violência, da corrupção, da injustiça”, repetiram os manifestantes em marchas sucessivas, atirando a popularidade do Governo de Peña Nieto para o mínimo histórico.

A detenção de La Tuta não pode deixar de ser considerada uma importante vitória política para o Presidente. Foi o seu antecessor Felipe Calderón quem declarou guerra aos cartéis da droga, mas é Enrique Peña Nieto que pode vangloriar-se de ter no currículo a captura dos dois mais temidos chefes do narcotráfico mexicano: Joaquín “El Chapo” Guzman, o líder do poderoso cartel Sinaloa, e agora Servando Gómez Martínez, La Tuta (o professor), de 49 anos.

O líder dos Caballeros Templarios [Cavaleiros Templários] era, há anos, o maior símbolo da corrupção e impunidade que levantavam dúvidas sobre a autoridade do Estado em largas regiões do México. Gómez Martínez não era apenas um ex-professor delinquente que dominava o lucrativo negócio de produção e venda de metanfetaminas para os Estados Unidos, como se apresentava em frequentes entrevistas com jornalistas estrangeiros onde também admitia ser um “fanático do tarot”. Era o homem mais influente e temido do estado do Michoacán, cujo poder residia no controlo absoluto alcançado pelo estabelecimento de um regime de medo e terror assente na intimidação, coerção e extorsão, tanto dos líderes políticos, como dos empresários e até dos cidadãos comuns

A sua conversão de professor em escolas rurais para capo do narcotráfico terá sido um capricho do destino: depois de tentar montar vários centros de ajuda para toxicodependentes, apercebeu-se que teria mais sucesso do outro lado do negócio. Passou então a “comercializar” drogas leves, e rapidamente evoluiu para o negócio mais rentável das metanfetaminas e cocaína.

O território do Michoacán era, na altura, dividido por vários grupos do narcotráfico. La Tuta negociou uma série de alianças para a criação do cartel conhecido como La Familia Michoacana, que assumiu o domínio do estado, por vezes em violentos combates com os rivais de outros estados, como os Zetas ou o Sinaloa. Mas a família começou a desmembrar-se e em 2010 Gómez Martínez autonomiza os seus Cavaleiros Templários, uma organização místico-criminosa e extremamente violenta.

O seu poder começou a ser desafiado em 2013, não pelos grupos rivais ou pela polícia, mas por organizações de vigilantes voluntários, baptizados como “grupos de auto-defesa”, e que sem mais nada a perder pegaram em armas contra os narcotraficantes. Um ano depois, o Exército nacional assumiu a responsabilidade pela segurança do estado, para evitar uma guerra civil. Com a chegada da tropa, La Tuta passou a ser, efectivamente, um fugitivo a viver nas montanhas, com a cabeça a prémio no México e nos Estados Unidos. A polícia apanhou-lhe o rasto há alguns meses: a operação de captura, às 4 da manhã, aconteceu com o mínimo sobressalto, com La Tuta a ser detido sem oferecer resistência, depois de comprar um cachorro-quente numa banca de rua em Morelia, a capital do Michoacán.

Segundo a Reuters, a polícia federal deveria “apresentar” Gómez Martínez à imprensa da Cidade do México ainda ao fim do dia. A imagem do perigoso capo algemado e subjugado à justiça, reproduzida em todos os jornais do país, funcionará como uma espécie de direito de resposta à carta aberta de censura ao Governo, subscrita por dezenas de líderes de organizações empresariais, multinacionais e think tanks, e publicada como anúncio de página inteira há menos de um mês. “Exigimos que o Governo garanta as condições necessárias para o desenvolvimento da nossa actividade económica em total segurança, em todo o país”, escreveram, fazendo referência aos raptos de funcionários, roubo de mercadorias e vandalismo de instalações, mas também à destruição da infra-estrutura do país – portos, bases aéreas, estradas sob o controlo de grupos marginais. O Presidente não pode “deixar de honrar o seu juramento de respeito pela Constituição: precisa de tomar as rédeas do país e partir para a ofensiva”, defenderam.

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