Unicer avisa que quotas às importações podem pôr em risco investimento em Angola

Limite de 400 mil hectolitros de cerveja que o governo angolano quer aplicar afecta o produto português mais exportado para este país. Nas águas, está em causa o abastecimento normal de água potável, diz empresa cervejeira.

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Unicer, liderada por João Abecasis, diz que quotas às importações terão "consequências gravosas" para economia angolana Fernando Veludo/NFactos

A quota às importações de cerveja, que Angola autorizou para 2015, terá “consequências muito gravosas para a economia angolana” e pode pôr em risco “a realização de investimento estrangeiro”. É assim que a Unicer, dona da cerveja Super Bock, reage à publicação em Diário da República de Angola do decreto executivo que fixa limites à importação de vários produtos alimentares de primeira necessidade e de bebidas.

O diploma com data de 23 de Janeiro autoriza a importação de, no máximo, 400 mil hectolitros de cerveja durante este ano o que, para quem tem Angola como principal comprador externo, pode traduzir-se em perda de vendas, com impacto directo nos resultados financeiros. Entre Janeiro e Novembro, Portugal exportou 132,1 milhões de euros desta bebida para o país africano, mais 14,7% do que em 2013. Este é, aliás, o produto mais vendido a Angola. O maior cliente dos cervejeiros nacionais consome 62% da cerveja que é produzida em Portugal.

No decreto executivo n.º 22/15, assinado pelos ministérios das Finanças, da Agricultura, das Pescas, da Indústria, do Comércio, dos Transportes e pelo Banco Nacional de Angola, são definidos limites à importação de mais de dois milhões de toneladas de produtos básicos como óleo, farinha, arroz ou açúcar. Nas bebidas não se pode comprar mais do que 950 mil hectolitros ao estrangeiro. Nos ovos o limite é de 156 milhões de unidades e nos hortofrutícolas o máximo são 184.500 toneladas.

A medida pode prejudicar as exportações portuguesas para Angola que, considerando nove dos produtos sujeitos a restrições, somaram mais de 207 milhões de euros até Novembro de 2014, o equivalente a 29,2% do total do comércio internacional de bens agrícolas e alimentares para aquele país.

Haverá também limites à importação de águas, na ordem dos 150 mil hectolitros. A Unicer, dona da marca Vitalis e detida em 56% pelo Grupo Viacer (BPI, Arsopi e Violas), acredita que este valor “seria manifestamente insuficiente para garantir o normal abastecimento de água potável ao povo angolano, com os consequentes riscos para a saúde pública que poderiam vir a ocorrer”.

De acordo com os últimos dados do INE, até Novembro Portugal exportou para Angola mais de 44 milhões de euros em águas, com e sem açúcar. Face ao mesmo período de 2013, representa uma descida de 12%. Com a adopção das quotas é provável que as vendas caiam ainda mais.

Em comunicado, a Unicer diz compreender a necessidade de aumentar a produção local e lembra que, nesta matéria, “é um agente activo”, através da Única, o projecto de investimento para a construção de uma fábrica, em parceria com sócios angolanos e que está em “avançada fase de desenvolvimento”.

A empresa liderada por João Abecasis diz que, já hoje, gera mais de 100 milhões de dólares (88 milhões de euros) de receita fiscal e mais de 300 postos de trabalho. Mas com a unidade de produção prepara-se para investir 143 milhões de dólares (126 milhões de euros) e criar 330 novos postos de trabalho directos, e três mil indirectos. “Este projecto possibilitará ainda a injecção de divisas no país por parte da Unicer, o que é um elemento crítico num momento em que Angola se debate com uma enorme escassez de divisas”, denota a empresa.

Assim, com um limite de 400 mil hectolitros as consequências para a economia angolana seriam “muito gravosas”. “Haveria uma redução bastante significativa das receitas fiscais: cada cerveja importada gera uma receita 3,5 vezes superior à gerada pelas cervejas locais”, argumenta. Além da eventual perda de postos de trabalho, as quotas podem pôr em risco “a realização de investimento estrangeiro em Angola e, dessa forma, comprometer a transição de volumes importados para produção local”. Ao mesmo tempo, corre-se o risco de aumento de preços, dada a redução da oferta de cerveja.

A concorrente Central de Cervejas, dona da Sagres, também reagiu ao decreto executivo e já admitiu que as restrições representam uma forte quebra de vendas, na ordem dos 25%. Paulo Gomes, director para Angola da empresa (detida pela Heineken), diz que está a analisar o impacto da medida. “Estamos apreensivos”, disse à Lusa. Depois de já ter tido planos para construir uma fábrica de raiz, que nunca chegou a avançar, a Central de Cervejas optou por fazer uma parceria com a Sodiba, empresa controlada por Isabel dos Santos e o marido, Sindika Dokolo.

A esperança dos cervejeiros é que os limites à importação sejam revistos, tendo em conta o “bom funcionamento do mercado e a satisfação dos consumidores angolanos”, como está previsto no diploma. A Unicer reafirma que Angola vai continuar a ser um “país prioritário” e é onde quer inaugurar a sua primeira fábrica fora de Portugal.

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