Manifesto no PS pede primárias já nas legislativas de 2015 e presidenciais

Movimento de uma centena de militantes e simpatizantes socialistas apresenta documento que pretende ser o embrião de uma reforma do sistema político. Uma herança segurista para além de Seguro.

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Proposta de primárias para todos os cargos: das autarquias à AR, da Europa a Belém ENRIC VIVES-RUBIO

Primárias já! Depois das pioneiras eleições directas para candidato a primeiro-ministro abertas a simpatizantes do PS, venham as primárias para os candidatos a deputados e, mais importante, a Presidente da República. É o que pedem os subscritores do Manifesto com esse nome lançado este fim-de -semana em http://www.facebook.com/primariasja.

Para já são cerca de uma centena, entre eles o fundador do PS António Campos, o ex-secretário nacional Eurico Brilhante Dias ou o deputado Paulo Campos. Mas pretendem ser o embrião de um movimento cívico que sirva de interface entre o PS e os cidadãos que não querem aderir aos partidos, garante Daniel Adrião, um dos promotores da iniciativa: “O PS precisa de levar um banho de cidadania”.

Para isso, o Manifesto propõe uma revisão dos estatutos do PS de modo a “alterar o actual paradigma partidário assente exclusivamente nos militantes, alargando o universo de participação aos cidadãos simpatizantes/eleitores do PS que se registem nessa qualidade, adquirindo estes capacidade eleitoral activa, isto é o direito de voto em todas as eleições internas”.

E quando dizem todas, querem dizer para todos os candidatos a titulares de cargos políticos, designadamente, Assembleia da República, Parlamento Europeu, Autarquias Locais, Governos Regionais dos Açores e da Madeira e Presidência da República. E o ‘já’ do nome também quer dizer agora: para as próximas eleições legislativas e presidenciais de 2015 e 2016.

Outro ponto a rever, segundo o manifesto, são as quotas. Permitir que os militantes votem sem ter esses pagamentos em dia contribui para acabar com “as más práticas que visam o controlo e a manipulação do voto dos militantes, os conhecidos ‘sindicatos de voto’, que constituem um forte bloqueio à democracia interna”.

A democratização, segundo os subscritores, deve ir ainda mais longe e permitir a participação directa na decisão de acordos de governo, instituindo a obrigatoriedade de realização de referendos abertos a militantes e simpatizantes/eleitores para decidir a celebração de coligações pré ou pós-eleitorais.

O Manifesto expõe o contexto que levou à iniciativa: “Nas últimas eleições Europeias, os três partidos que têm integrado as soluções de governo em Portugal desde 1976 obtiveram em conjunto menos de 2 milhões de votos, pouco mais de 20% dos eleitores inscritos. Será sustentável um regime democrático, cujo sistema político está assente no apoio de pouco mais de 20% dos portugueses?”

O que propõe, por isso, é levar mais longe o espírito que levou António José Seguro a fazer primárias para candidato a primeiro-ministro, como Jorge Sampaio a realizar as primeiras directas para secretário-geral em 1994, ou em 2001 levara Guterres a abrir as candidaturas autárquicas a independentes.

“É chegada a hora do PS prosseguir a abertura à sociedade portuguesa que marcou toda a sua história. (…) Desde a sua génese, o PS foi sempre muito mais do que um partido de militantes, foi sempre um grande partido de matriz popular, intergeracional e interclassista, com implantação em todo o território nacional. Ao valorizar o papel dos seus simpatizantes e eleitores, o PS aproxima-se dos cidadãos que lhe confiam o seu voto. É imperioso que a opinião dos simpatizantes e eleitores do PS seja incorporada na vida do partido e nas decisões que este toma”, reza o manifesto.

Sistema político na mira
Mas esta é só a primeira parte. Depois da “internalização” destes mecanismos democráticos no PS, aponta-se para todo o sistema político, da Lei Eleitoral para a Assembleia da República à revisão da Constituição. Efectivar os círculos uninominais, adoptar o sistema de voto preferencial (que permite a votação em nomes, e não nas listas dos partidos) ou abrir as candidaturas a deputado a grupos de cidadãos independentes são apenas algumas das propostas apresentadas. Não em definitivo, como diz Daniel Adrião, mas como plataforma para um “crowdsourcing de ideias” para lançar o debate. Primeiro nas redes sociais, depois num evento a realizar até Março.

“Este manifesto deve ser um ponto de partida, não um ponto de chegada”, corrobora Carlos Zorrinho, o eurodeputado que, não tendo subscrito o documento, está disposto a participar no debate e não só: “Farei tudo o que estiver ao meu alcance para que o maior número possível de pessoas possa subscrever o documento”, diz ao PÚBLICO. Não subscreveu porque tem dúvidas sobre propostas como a limitação do mandato de deputado ou sobre se os ministros devem ser escolhidos apenas entre os eleitos à Assembleia da República.

Mas sente também a responsabilidade de quem, já em 1995, deu nome ao Documento Zorrinho, que propunha a abertura do partido à sociedade. “Hoje os partidos têm que se abrir muito mais. Se o PS não o fizer, pode surgir no seu âmbito um Podemos ou outro fenómeno” de popularidade, alerta. E justifica-se: “Não subscrevi o manifesto para não ficar um documento fechado” no círculo que apoiou António José Seguro nas primárias. Certo é que a última proposta de Seguro era a reforma do sistema político. Como também a moção de António Costa ao último congresso deixa essa porta entreaberta.

“Faz sentido aperfeiçoar as condições de exercício da democracia partidária, com destaque para a maior facilitação da capacidade electiva dos militantes, bem como da valorização da participação dos simpatizantes, tanto pela susceptibilidade da realização de eleições primárias para a designação de candidatos a titulares de cargos políticos, como pela possibilidade da sua participação regular em instâncias de reflexão política”, lê-se na moção. É o que pedem os manifestantes. Passar a factos.

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