Câmara de Mértola e caçadores contestam libertação dos linces

Autarquia diz que não há coelhos suficientes e que o processo foi “apressado mal preparado e incorrecto”.

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Linces foram introduzidos no cercado de Mértola a 16 de Dezembro. Estiveram lá um mês e meio João Silva

A Câmara Municipal de Mértola contesta o processo de reintrodução do lince ibérico no concelho, classificando-o de “apressado, mal preparado e incorrecto”.

Num comunicado na terça-feira à noite, horas depois de serem libertados dois linces num cercado numa zona de caça da região, a autarquia afirma que o Ministério do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia quis criar uma situação de “facto consumado”.

“Solte-se o lince que depois obrigamos todos a aceitá-lo”, realça a Câmara Municipal, advertindo para as inúmeras questões que permanecem por responder, e que podem “implicar directamente nas actividades que hoje se desenvolvem no território”.

A autarquia diz que a libertação dos dois linces resulta de um processo “estritamente político”, escolhendo-se “talvez a pior altura para a solta, depois da época de caça onde foram abatidos uma parte dos coelhos” – que são o principal alimento daquela espécie de felino em risco de extinção.

Segundo o Ministério do Ambiente, havia no final do Verão – há cerca de três meses – 3,5 coelhos por hectare na zona de libertação, quando o mínimo necessário para os linces são dois por hectare. A Câmara de Mértola não acredita nestes números. “Foram erro de contagem ou foram adulterados”, escreve no comunicado.

A autarquia diz que não foi oficialmente avisada até ao momento em que Mértola foi o concelho escolhido para a reintrodução. A sua posição “é desfavorável à reintrodução”, enquanto a população residente no concelho não for auscultada sobre todo o processo.

“Não basta soltar o lince, para o processo ser responsável. Têm de se criar condições para o manter, o que não aconteceu até aqui”, refere o comunicado, acrescentando: “O território escolhido é cruzado por imensas estradas, que além de não permitirem ao animal o sossego exigido, são um perigo constante devido às fortes possibilidades de atropelamento”.

Além dos dois linces, que deixarão o cercado onde se encontram possivelmente no final de Janeiro, mais oito serão libertados na região nos próximos meses. O Ministério do Ambiente celebrou contratos com proprietários da zona, para a gestão dos habitats do lince. Mas a Câmara de Mértola diz que são insuficientes, pois envolvem poucos proprietários “que no seu conjunto têm menos de 5000 hectares não contíguos”.

Também a Federação Portuguesa de Caça (Fenacaça) contesta a operação de libertação dos linces, que classifica como “um espectáculo mediático e deprimente”. A Fenacaça desconfia das estatísticas que indicam haver 3,5 coelhos por hectare na região. “Se isso fosse verdade, estariam todas as zonas de caça do concelho de Mértola contentes e seguramente não era necessário trazer coelhos de Espanha para alimentar os linces agora no parque”, referem os caçadores, num comunicado.

Três dezenas de coelhos foram introduzidos no cercado onde estão os linces, de modo a proporcionar-lhes alimento numa primeira fase de adaptação. Quinzenalmente serão reforçados.

A Fenacaça teme que não se saiba o estado sanitário dos coelhos, nem se serão da mesma subespécie que existe em Portugal.

A associação ambientalista Almargem também teceu críticas ao processo, defendendo maior entendimento e mais contrapartidas aos proprietários locais para manter os habitats do lince, bem como medidas mais eficazes para evitar atropelamentos e recuperar a população de coelhos.

Nem a Fenacaça, nem a Almargem juntaram-se ao pacto pelo lince ibérico, lançado pelo Ministério do Ambiente em Julho passado, que foi subscrito por outras organizações de caçadores e de defesa do ambiente.


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