Bruxelas está mais uma vez de olho no Google

Parlamento Europeu vai analisar proposta para separar motor de busca dos outros negócios. Decisão não será vinculativa, mas pressiona a Comissão.

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O motor de busca tem 90% do mercado na Europa AFP

A União Europeia tem um historial de preocupações com gigantes tecnológicos como o Google e a Microsoft. Desta vez, o Parlamento Europeu prepara-se para votar uma proposta de resolução onde se inclui um apelo para que a Comissão Europeia obrigue as empresas que têm motores de busca a separá-los de outros negócios.

A multinacional não adoptou uma posição pública sobre o assunto, mas não é provável que tenha preocupações a curto prazo. A decisão que o Parlamento vier a tomar não tem efeito vinculativo, uma vez que as questões de concorrência não são uma competência dos deputados. Uma eventual aprovação funcionará, porém, como uma forma de pressão sobre a Comissão, que tem poderes de regulação e onde a pasta da Concorrência está agora com a dinamarquesa Margrethe Vestager, que herdou do antecessor investigações que correm há vários anos sobre o Google.

A proposta de resolução, que os eurodeputados deverão votar esta semana, lista várias outras sugestões, com a finalidade de garantir o funcionamento do mercado digital europeu. O documento refere que, neste sector, “o mercado da pesquisa online é de particular importância” dado que os motores de busca podem condicionar o acesso a informação e explorá-la comercialmente. Separar os serviços de busca dos restantes negócios poderá ser “uma solução potencial a longo prazo”.

O Google não é sequer mencionado, mas o facto de ter uma quota de mercado a rondar os 90% na Europa - significativamente acima dos 67% que tem nos EUA - e de a empresa se espalhar por um vasto leque de negócios, serviços e plataformas (muitos dos quais lideram nas respectivas áreas) fazem com que a multinacional seja o alvo claro da proposta.

A proposta foi apresentada pelo eurodeputado centrista espanhol Ramon Tremosa e por Andreas Schwab, um eurodeputado democrata-cristão da Alemanha, precisamente o país onde o Google travou uma acesa batalha com os editores de jornais e revistas por causa de direitos de autor. Ao defender a proposta, Schwab argumentou que ter “duas posições dominantes no mercado nunca foi bom”.

O negócio do Google passa sobretudo por vender anúncios, tanto nos seus  sites e serviços (entre os quais o Gmail, o YouTube, os Mapas e o agregador de notícias Google News), como também noutros sites, que podem exibir anúncios do Google e receber uma parte do que os anunciantes pagam. No último trimestre, a empresa facturou em todo o mundo 16.520 milhões de dólares (13.350 milhões de euros), a grande maioria com anúncios. A publicidade nos próprios sites representou 21% do total. 

Para além disto, o Google também faz dinheiro com a venda de serviços, como espaço de armazenamento online e aplicações de produtividade (editores de texto e folhas de cálculo, por exemplo). Tipicamente, oferece parte dos serviços gratuitamente e cobra um valor mensal ou anual por acréscimos ao serviço ou quando a utilização é feita por empresas. Desenvolve também o browser Chrome, o primeiro a fazer frente em muitos anos à hegemonia do Internet Explorer, da Microsoft, e lidera o desenvolvimento do sistema operativo Android, que equipa a grande maioria dos tablets e smartphones no mercado.

Muitos daqueles serviços do Google são indissociáveis do motor de busca. Uma pesquisa poderá apresentar entre os resultados os serviços de mapas ou até sugestões de voos, dificultando o negócio de sites especializados que queiram trabalhar naquelas áreas. Já o sistema Android tem incorporada a pesquisa do Google, colocando-a assim no bolso de milhões de pessoas. E a conta do Gmail é usada para aceder aos vários serviços, permitindo recolher um vasto manancial de dados sobre cada utilizador, que é depois usado para apresentar informação, e anúncios, personalizados.

O Google já tinha sido uma das grandes preocupações do anterior comissário da Concorrência, Joaquín Almunia, que teve em mãos uma investigação de vários anos motivada por queixas de outras empresas, entre as quais a Nokia, a Microsoft e alguns sites especializados em viagens.

Num processo lento, a Comissão acabou por identificar quatro práticas do Google que suscitaram preocupações concorrenciais, duas relativas à pesquisa online e outras duas ao negócio da publicidade (a multinacional impedia alguns dos sites que exibem os seus anúncios de aceitar publicidade de outras empresas). Almunia conseguiu que a empresa concordasse em fazer várias alterações à forma como apresenta os resultados de pesquisa, permitindo um maior destaque para serviços rivais, mas a finalização dos processos em curso deverá passar pela actual comissária.

O Google não foi o único gigante tecnológico a ser alvo da atenção do regulador europeu, que tem uma tradição de ser mais interventivo nestas áreas do que o congénere americano. A Microsoft, por exemplo, foi obrigada em 2010 a incluir no sistema Windows uma opção para os utilizadores escolherem browsers alternativos ao Internet Explorer. Quando a Microsoft deixou de o fazer anos mais tarde, a Comissão aplicou-lhe uma multa de 561 milhões de euros.

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