Governo gostaria que Júlio Pereira abandonasse secretas pelo seu pé

Até agora, o primeiro-ministro, com tutela directa sobre os serviços, não comunicou aos socialistas qualquer intenção de mudança.

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Júlio Pereira Miguel Manso

O Governo gostaria que Júlio Pereira abandonasse o cargo de secretário-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa, órgão de cúpula das secretas que superientende o Serviço de Informações de Segurança (SIS) e o SIED [Serviço de Informações Estratégicas de Defesa]

É este o cenário que mais conviria a Passos Coelho que, assim, não teria de demitir Pereira, contentaria sectores do PSD e evitaria um choque com os socialistas com os quais, tradicionalmente, são acordadas as nomeações nos serviços de informação.

No seio da maioria, onde Júlio Pereira tem apoios, os desenvolvimentos da Operação Labirinto sobre a concessão de vistos gold envolvendo as secretas forneceram munições aos opositores do responsável que, desde 19 de Abril de 2005, dirige o SIRP. Surpreendeu a limpeza electrónica por funcionários do SIS ao gabinete de António Figueiredo, director do Instituto de Registos de Notariado (IRN), em prisão preventiva.

Em comunicado de há uma semana, o secretário-geral do SIRP revelou que a instituição “mantém estreita colaboração institucional/operacional, em matérias de elevada sensibilidade, com o IRN”. Contudo, na opinião pública é negativa a imagem de um organismo de segurança que deu protecção a um alto funcionário acusado de corrupção e que era alvo de um seguimento por mandato judicial.

A divulgação posterior de que o chefe das secretas esteve entre os várias convivas que participaram num jantar em casa de Maria António Anes, secretária-geral do Ministério da Justiça detida na Operação Labirinto, reforçou os críticos. Embora o cargo de Pereira esteja na dependência directa do primeiro-ministro, o PÚBLICO sabe que na maioria não é unânime a posição de o demitir.

O abandono pelo seu pé de Júlio Pereira evitaria, assim, incómodos ao executivo, que pretende concentrar os seus ataques em António Costa e não se dispersar numa polémica de demissão em fim de mandato, a um ano de eleições. A saída seria, então, vista na opinião pública como um dano colateral da investigação à concessão dos vistos gold. Uma questão a ser abordada na próxima quarta-feira, na comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, por requerimentos do PCP e do BE. Júlio Pereira deverá vir a ser ouvido pelos deputados após a intervenção do Conselho de Fiscalização presidido pelo social-democrata Paulo Mota Pinto.

Resistir a pressões tem sido prática do líder do SIRP, o que lhe valeu o epíteto de sobrevivente. E se, como foi garantido ao PÚBLICO, tem planos para o futuro dos serviços que dirige desde José Sócrates, é porque não se sente incomodado. Com o nível de secretário de Estado, o seu interlocutor é o primeiro-ministro. E é com Passos Coelho que, nos próximo dias, despachará a substituição de Horácio Pinto no SIS.

Este já teve um prolongamento de três anos aos seis de comissão fora da magistratura judicial. Em princípios de Dezembro abandona funções. O perfil de quem o substituir é um termómetro do estado da relação do primeiro-ministro e o chefe das secretas.

É pretendido que o substituto de Pinto seja técnico e  conhecedor da área das informações, quando a Europa ocidental teme os efeitos da nova forma de terrorismo do autoproclamado Estado Islâmico. Neiva da Cruz, actual número dois do SIS, Paula Morais, chefe de gabinete de Pereira, e Helena Rego são os nomes apontados. Já a opção por um magistrado é encarada como um low profile à revelia do interesse dos serviços e seria interpretada como desconfiança do poder político face “à casa”. Um sinal que poderia levar Júlio Pereira a decidir da sua continuidade.

No entanto, já em 2011, quando Passos Coelho chegou a São Bento, foi dada como certa a substituição de Pereira. Foram, então, avançadas várias hipóteses. Da magistrada Margarida Blasco, ex-directora do SIS e actual inspectora-geral da Administração Interna, a Paulo Vizeu Pinheiro, assessor diplomático de Passos agora embaixador na OCDE. Também eram apontados os nomes de Antero Luís, juiz do Tribunal da Relação de Lisboa e antigo responsável do SIS, e do general Carlos Chaves, adjunto do gabinete do primeiro-ministro para a Segurança e Defesa e que nesta área fez a coordenação do programa eleitoral do PSD.

Mas Júlio Pereira foi confirmado no cargo. Em 2011, para Passos, o enfoque essencial era a economia, na sequência da assinatura do memorando da troika. O perfil de “fiel à hierarquia” de Pereira foi-lhe, até agora, suficiente para se manter no posto.

Por fim, e até agora, o primeiro-ministro não deu indicações ao PS de o pretender substituir no SIRP. Tem sido prática habitual que a nomeação para as chefias da secreta seja acordada entre os principais partidos – PSD, PS e CDS. No entanto, esta semana ainda não chegou aos socialistas qualquer comunicação de Passos Coelho sobre o assunto. Nem para o PS é este o momento de alterações profundas nos serviços de informação. Assim seria considerada, a um ano de eleições, a substituição do líder do SIRP.

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