Cameron recusa pagar mais 2,1 mil milhões para orçamento da UE

Reino Unido foi chamado a entregar uma contribuição adicional já em Dezembro. Não pagamos, responde o primeiro-ministro britânico.

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Cameron e Angela Merkel, chanceler da Alemanha, que será ressarcida em quase 800 milhões AFP/ ERIC FEFERBERG

O primeiro-ministro britânico, David Cameron, deixou nesta sexta-feira bem claro que o Reino Unido não pagará a contribuição adicional para o orçamento da União Europeia (UE), depois de se saber que Bruxelas vai exigir, já a 1 de Dezembro, mais 2100 milhões de euros ao país.

“Não pagarei esta taxa adicional a 1 de Dezembro. E se alguns pensam que isso acontecerá, esperem para ver”, frisou, durante uma conferência de imprensa. "É inaceitável esta organização trabalhar desta maneira", disse o primeiro-ministro britânico citado pela AFP.

Cameron aproveitou para deixar um recado: “Não ajuda a presença da Grã-Bretanha na UE”, que prometeu referendar em 2017 se vencer as eleições do próximo ano. E acrescentou que interrompeu a Cimeira Europeia na manhã desta sexta-feira, por uma hora, para exigir "uma reunião de emergência" dos ministros das Finanças da UE.

"Há ajustes todos os anos, uma vezes pagamos um pouco mais e outras menos. Mas nunca aconteceu termos de pagar uma conta de 2000 milhões de euros", sublinhou.

E reiterou: "Não vamos de repente passar um cheque de 2000 milhões de euros. Isso não vai acontecer".

O timing desta revelação é péssimo para Cameron, que tem o partido populista anti-UE UKIP a subir nas sondagens e que ameaça conseguir um segundo deputado no Parlamento britânico numa eleição intercalar local (ainda há duas semanas conseguiu o seu primeiro deputado deste modo), quando falta pouco mais de meio ano para as legislativas. “O sistema encoraja a não acertar para que os outros paguem a conta”, reagiu o recém-eleito deputado do UKIP Douglas Carswell.

Estas taxas, pagas por todos os Estados-membros, vão sofrendo revisões anuais, tendo por base indicadores como a evolução do produto nacional bruto (PNB), que contabiliza a actividade económica de um país (excluindo as empresas estrangeiras e incluindo as empresas nacionais que operam no exterior) ou as receitas com a cobrança do Imposto sobre Valor Acrescentado (IVA). No passado, apontam analistas, o Reino Unido beneficiou destes ajustes, pagando menos do que o previsto.

Mais munições para os eurocépticos britânicos: Cameron fez uma intensa campanha para a redução do orçamento, e é justamente no orçamento que agora se vê penalizado.

No entanto, 2014 é um ano extraordinário, fruto das alterações metodológicas introduzidas pelo Sistema Europeu de Contas, que tiveram impacto na forma como se contabiliza a actividade económica dos Estados-membros. Estas mudanças levaram, por exemplo, a que as despesas com investigação e desenvolvimento passassem a estar mais bem representadas no cálculo das contas nacionais e a que actividades como a prostituição e o tráfico de droga passassem a ser tidas em conta. E, por isso, alguns países são agora considerados mais prósperos do que o inicialmente previsto. 

Durão reage às críticas
Durão Barroso, prestes a deixar a presidência da Comissão Europeia, reagiu de imediato às críticas, argumentando que "não há razão para surpresas". Na conferência de imprensa final da última cimeira em que participou, declarou que estas taxaas "são calculadas com base em mecanismos a que todos [os Estados-membros] deram o acordo por unanimidade".

Os 2125,3 milhões agora exigidos ao Reino Unido somam-se aos 10.900 mil milhões pagos em 2013. Ou seja, trata-se de um aumento de quase 20% face ao valor inicial da contribuição.

A rectificação é transversal a todos os Estados-membros, como mostra um documento noticiado nesta sexta-feira pelo Financial Times, mas os cofres britânicos serão os mais penalizados. Aliás, apenas nove países são chamados a pagar mais, sendo que o segundo lugar nesta lista, que pertence à Holanda, está a uma larga distância do Reino Unido, com um extra de 642,7 milhões de euros.

O jornal britânico dá também conta da reacção negativa da Holanda, com o ministro das Finanças do país, a criticar a forma como os países foram informados destas alterações. "Não estou satisfeito", declarou Jeroen Dijsselbloem.

Cameron citou o seu homólogo italiano, Matteo Renzi, que terá reagido à revelação dizendo: “Isto não é um número. Isto é uma arma mortífera”.

Pelo contrário, outros países têm direito a ser ressarcidos. É o caso da Alemanha e de França, que de acordo com o jornal britânico, receberão de volta 779,2 e 1016,3 milhões de euros, respectivamente.

O mesmo acontecerá com Portugal, que, de entre os países reembolsados, terá direito à verba mais pequena: 500 mil euros. Analisando todos os 28 Estados-membros, o acerto de contas será globalmente benéfico, pressupondo a devolução de 419,9 milhões de euros.

Na nota onde constam estes valores, a Comissão Europeia reconhece que “está ciente de que, em alguns casos, [esta revisão] poderá ter um impacto orçamental significativo”.

Bruxelas nota que os indicadores que estão na base da decisão ainda carecem de confirmação, pelo que o valor final a entregar ou recuperar a 1 de Dezembro “será comunicado oficialmente ao Estado-membro em Novembro”, refere o documento.

De acordo com o Financial Times, haverá abertura por parte da chanceler alemã, Angela Merkel, para reavaliar os montantes exigidos pela Comissão Europeia. O jornal adianta ainda que é provável que o tema seja acrescentado à ordem de trabalhos da próxima reunião do Ecofin, agendada para 7 de Novembro.

O orçamento alterado ainda tem de ser aprovado pelos 28 governos da UE e pelo Parlamento Europeu, diz o diário britânico The Guardian, pelo que poderá ser alterado se Londres conseguir aliados – e conseguirá algum apoio entre governos que não querem dar argumentos aos que defendem a saída do Reino Unido da UE.

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