Azul em sangue

Mathieu Amalric adapta Georges Simenon num filme inteligente mas demasiado cerebral.

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Trailer O Quarto Azul

É irresistível fazer a ligação entre O Quarto Azul, adaptação certinha de um romance de mestre Georges Simenon, e Tournée – Em Digressão (2010), o anterior filme realizado pelo grande Mathieu Amalric – parece que, quando passa para o outro lado da câmara, o actor francês gosta de contar histórias de homens perdidos em universos femininos, meros joguetes nas mãos das mulheres que o fascinam.

O quarto azul do título é o quarto de hotel onde Julien, pacato pai de família provincial, vive um caso tórrido com uma antiga colega de escola. É também a cor da sala de audiências do tribunal onde ele e a amante se encontram a dada altura – porque, sendo isto uma adaptação de Simenon, há um crime ao barulho. E Amalric guia o espectador, com admirável eficácia e economia, por um percurso atribulado feito de avanços e recuos, de flashbacks e pontos de vista diferentes.

Mas, se é verdade que o realizador/actor/argumentista captura habilmente o modo como Simenon erguia à universalidade os pequenos fait-divers quotidianos, o fatalismo inexorável desta história de amor e sangue exigiria outra garra, mais carnal e menos cerebral, para se tornar num grande filme. É, de algum modo, mais a sombra de Claude Chabrol, que parecia ter nascido para contar estas histórias, do que do criador do inspector Maigret que paira por aqui – e se Amalric se mede bem com Simenon, é demasiado simpático e compreensivo para atingir o cinismo brutal de Chabrol, que seria mais apropriado para demonstrar como Julien não passa do proverbial tanso que tanto filme negro clássico ergueu a figura central. Ficamos com mais uma prova de que Mathieu Amalric-realizador não fica atrás de Mathieu Amalric-actor, mas por enquanto não o ultrapassa. 

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