Ministério Público andará atrás de um sinal de 60 milhões pago pela Escom

O DCIAP quis saber junto da advogada Ana Bruno informações sobre o negócio de venda da Escom à Newbrook e sobre as suas relações com Ricardo Salgado.

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DCIAP procurou inteirar-se se a advogada esteve envolvida no negócio de venda da Escom à Sonangol Adriano Miranda

No dia em que antigo presidente do BES, Ricardo Salgado, foi detido para interrogatório no âmbito do caso Monte Branco, o PÚBLICO apurou que na mira das autoridades está também a advogada luso-angolana Ana Almeida Bruno, que se encontrava fora do país quando, nesta quarta-feira, as autoridades entraram nas instalações do seu escritório nas Torres das Amoreiras, em Lisboa. Segundo a fonte oficial da advogada, as buscas desencadeadas pelo Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), em articulação com inspectores tributários, não resultaram em detenções ou apreensão de documentação.

As autoridades procuram saber detalhes sobre o papel desempenhado (e os conhecimentos dos factos) por Ana Bruno quando, em 2011, a Rioforte, holding para a área não financeira do Grupo Espírito Santo (GES), vendeu 67% da Escom à empresa angolana Newbrook, de que a advogada era administradora. O negócio de 500 milhões de euros foi conduzido por Ricardo Salgado.

O investidor angolano entregou a título de sinal cerca de 60 milhões de euros. Mas a verba não chegou à Rioforte (que esta semana pediu já a protecção de credores). O destino desta quantia é uma das questões que o Ministério Público quer apurar. Hélder Bataglia, que possuía a restante parcela do capital da Escom, de que era o presidente, não esteve nas conversações.

Venda abortada
Apesar de ter sido amplamente divulgada, a venda da Escom — um veículo instrumental do GES que serviu para negócios menos públicos, particularmente os que envolvem relações entre empresas e Estados — nunca foi concretizada, pois a Newbrook não liquidou os restantes 440 milhões acordados. Os contactos luso-angolanos começaram no Verão de 2010 e culminaram na assinatura, meses depois, em Lisboa, de um contrato-promessa, que avaliava a Escom em cerca de 800 milhões de euros. A formalização do negócio ocorreu no ano seguinte.

Em 2013, Ricardo Salgado confirmou que apenas recebera um sinal, “uma pequena parcela”. “Conseguimos fazer os aumentos de capital, conseguimos reforçar os meios financeiros do GES, sem ter que executar a venda da Escom. De qualquer forma, consideramos que essa transacção, eventualmente com alguns ajustamentos, deve ser objecto da finalização”, explicou na altura. 

O Banco de Portugal obrigou já este mês o BES a registar uma imparidade associada à Escom de 300 milhões de euros, o que atira a exposição do banco ao GES para 1,5 mil milhões de euros.

No quadro da operação Monte Branco, o Ministério Público investigou 12 transferências de 27,3 milhões efectuadas entre Julho de 2009 e Julho de 2011, já depois de ter começado a “manipulação” das contas das holdings do GES e da venda da Escom. Os movimentos partiram do Banco Espírito Santo Angola para contas no Credit Suisse da Savoices e da Allanite, ambas identificadas na investigação, mas cujos titulares eram empresas com sede no Panamá e cujos beneficiários serão Ricardo Salgado e Amílcar Morais Pires.

Os investigadores estão também a olhar para movimentos que passaram pelo BES Dubai e pelo ES Bank Venezuela. A Savoices, que estará ligada a Ricardo Salgado, recebeu 13,8 milhões de dólares.

Ligações a Canals
Tal como Ricardo Salgado, Ana Almeida Bruno era cliente do antigo gestor de fortunas da União de Bancos Suíços (UBS), Michel Canals, em representação de investidores angolanos. As autoridades detectaram ainda uma transferência de verbas para um familiar da advogada após este ter, supostamente, movimentado a verba via a rede de Canals. Ana Bruno, também administradora da Newshold (dona do semanário Sol), está ainda ligada à sociedade imobiliária Acron Berlin Brandeburg e é amiga e sócia de Helder Bataglia, o rosto e accionista minoritário da Escom.

Já em 2013 o DCIAP tinha feito buscas ao escritório de Ana Bruno, onde apreendeu o contrato de compra e venda da Escom, além de outra documentação. Esta quarta-feira procurou inteirar-se de novos detalhes sobre a transacção, mas também sobre as relações da advogada com Ricardo Salgado. 

Em simultâneo com a alienação da Escom, a Rioforte vendeu à Newbrook o controlo da construtora Opway Angola e, neste caso, recebeu o acordado, cerca de 15 milhões de euros. A construtora foi criada em 2009 entre o GES e a Opway Engenharia. 

A Escom, que esteve envolvida no caso Portucale e no negócios das contrapartidas com os submarinos, chegou a ter uma forte posição nas áreas da construção, minérios, petróleos e do imobiliário.

A “prenda” de 14 milhões
As críticas à idoneidade de Ricardo Salgado para liderar uma instituição financeira a quem os clientes depositam confiança para guardar as suas poupanças começaram em 2012, quando se soube que tinha tido um papel de cobrador de comissões de um cliente construtor. O caso polémico teve a ver com uma transferência de 14 milhões de euros do empresário do sector da construção, o luso-angolano José Guilherme, para sociedades offshore ligadas ao banqueiro. Salgado justificou a verba como um presente e uma comissão pela consultoria prestada a José Guilherme na sua actividade em Angola.

E quando, há dois anos, em Dezembro de 2012, Salgado foi ao DCIAP no âmbito de uma inquirição, o antigo banqueiro explicou que aderira ao Regime Excepcional de Regularização Tributária de 2012 para regularizar as suas dívidas (o que fez por três vezes) ao fisco relativas às verbas concedidas por José Guilherme.

 

 

 

 

 

 

 

 
 

 

 
 

 

 
 

 

 
 

 

 

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