Putin critica "ultimatos" e promete reagir “proporcionalmente" às “ameaças externas”

Corpos de vítimas do voo MH17devem chegar esta quarta-feira à Holanda. União Europeia discute agravamento de sanções, mas entendimento não é fácil.

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Caixas negras deverão contribuir para clarificar o que aconteceu com Boeing malaio Damien Simonart/Reuters

O Presidente Vladimir Putin prometeu que a Rússia usará a sua influência junto dos separatistas ucranianos para permitir uma investigação à queda do Boeing 777 da Malaysia Airlines. Mas acrescentou que o Ocidente deve também pressionar o Governo de Kiev a acabar com os combates e reagiu contra o que considera o “ultimato” que lhe tem sido feito, prometendo responder “proporcionalmente”.

Quase ao mesmo tempo, os ministros dos Negócios Estrangeiros dos 28 países da União Europeia (UE) discutiram um agravamento de sanções contra a Rússia que deverá ser anunciado na quinta-feira. Num primeiro tempo deverá ser alargada a lista de pessoas e instituições visadas nos últimos meses pelo congelamento de bens e proibição de viajar. Depois poderão ser adoptadas medidas contra sectores estratégicos da economia russa.

Os desenvolvimentos políticos da crise ucraniana – agora influenciada pela queda do avião, na quinta-feira – ocorreram numa altura em que em Kharkov, cidade controlada pelas forças governamentais ucranianas, se preparava o envio para a Holanda dos corpos de vítimas da tragédia, que ali chegaram na manhã desta terça-feira, levados de comboio desde a zona controlada pelos rebeldes pró-russos onde o aparelho se despenhou. Os corpos devem seguir esta quarta-feira para Eindhoven, na Holanda. Fonte oficial holandesa citada pela BBC disse que, ao contrário do anunciado na véspera pelos rebeldes, só 200 corpos e não 282 foram transportados. No avião seguiam 298 pessoas.

Ainda na noite de segunda-feira, as caixas negras do avião foram entregues por Alexander Borodai, designado primeiro-ministro da autoproclamada República de Donetsk, a uma delegação malaia. Os registos deverão permitir saber o momento exacto do incidente, a altitude e posição do avião. Poderão também incluir conversas no cockpit que contribuam para determinar a causa da queda.

Na mais elaborada reacção às críticas dos países ocidentais ao papel russo na Ucrânia desde que o voo MH17 foi derrubado, Vladimir Putin disse, esta terça-feira, numa reunião do Conselho de Segurança da Rússia, que vai interceder junto dos rebeldes, mas que espera também gestos das autoridades ucranianas.

“Apelam a que pressionemos os rebeldes. Claro que faremos tudo o que estiver ao nosso alcance, mas isso não basta”, afirmou, segundo os relatos das agências noticiosas russas. “É preciso apelar às autoridades ucranianas para que respeitem as normas básicas de decência e apliquem um cessar-fogo pelo menos durante o tempo em que durar a investigação”, afirmou.

Na segunda-feira, o Presidente ucraniano, Petro Poroshenko, anunciou ter ordenado ao Exército que não desencadeasse ofensivas num raio de 40 quilómetros à volta do local onde caiu a avião. Horas mais tarde, os rebeldes pró-russos  – suspeitos da autoria do derrube do avião –  anunciaram medida semelhante para uma área mais limitada: dez quilómetros.

Mais longe, Severodonetsk, cidade de 110 mil habitantes, a uma centena de quilómetros da praça-forte separatista de Lugansk, foi reocupada pelas forças governamentais. Um porta-voz militar ucraniano informou também que, durante a madrugada, um posto de controlo tinha sido atacado por um bombista suicida que se fazia transportar num minibus.

Nas suas declarações, Vladimir Putin defendeu o reforço da capacidade militar russa como forma de proteger a economia do país de “ameaças externas”. Moscovo, disse, reagirá “proporcionalmente à aproximação das infra-estruturas da NATO” das fronteiras russas. “Vemos o que está a acontecer. As forças da NATO nos países da Europa de Leste reforçam-se ostensivamente, incluindo nas águas do mar do Negro e do mar Báltico.”

Consenso difícil
Em Bruxelas, os ministros dos Estrangeiros da UE concordaram, segundo a Reuters, não só em alargar a lista de pessoas e entidades visadas por sanções – decisão já tomada antes da queda do avião –, como em estudar medidas adicionais em áreas como os serviços financeiros e tecnológicos, a defesa e a energia.

O facto de não terem sido imediatamente tomadas decisões confirma a dificuldade de um consenso entre os parceiros europeus sobre a estratégia a seguir no relacionamento com a Rússia. O exemplo mais flagrante das divergências é a firme intenção da França de manter o compromisso de venda a Moscovo de uma fragata, fazendo depender a venda de uma segunda, já acordada, da evolução da situação.

O principal descontente com a venda é o Reino Unido. Na segunda-feira, o primeiro-ministro britânico, David Cameron, defensor de um endurecimento das sanções, qualificou a atitude francesa como “impensável” no actual contexto. Ao mesmo tempo que se empenha no agravamento das sanções contra a Rússia, o Governo de Londres ordenou, esta terça-feira, uma investigação à morte do opositor e antigo agente russo Alexandre Litvinenko, que morreu em 2006, na capital britânica, envenenado com polónio. Numa carta escrita antes de morrer, acusou Putin de ter ordenado o seu assassínio. Ainda que o executivo britânico tenha negado que a decisão esteja relacionada com a actual situação, o facto de ter avançado com um inquérito que sempre antes rejeitou foi vista como sinal do desagrado para com as autoridades de Moscovo.

Uma posição mais dura da UE para com a Rússia – países como a Suécia, a Áustria e a Lituânia defendem, segundo a Reuters, um embargo da venda de armas – é também apoiada pelos Estados Unidos.

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