No conforto do cliché

Os filmes em puzzle de histórias de Paul Haggis são formas de embalar o episódico e o irrelevante.

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Talvez seja a meio de Na Terceira Pessoa que alguém atira à personagem do escritor interpretada por Liam Neeson que ele se refugia cada vez mais, com os seus livros e personagens, no estereótipo confortável. Será excessivo ver nesse diálogo do filme um momento em que Paul Haggis, argumentista, realizador, está a falar dele próprio na terceira pessoa — seria pedir-lhe coisas enormes em termos de exposição e ferocidade. Mas há razões para dizer o mesmo a Paul Haggis: que nunca deixa o conforto do cliché e que nesse sentido os seus filmes são formas de embalar o episódico e o irrelevante.

Embalar: com a estrutura de diferentes histórias, puzzle em que o argumentista Haggis vai forçando rimas, tons, ecos, fica criada no espectador a ilusão de ressonância, de profundidade, mas depois o realizador Haggis está sempre (involuntariamente) a expor a falsidade, incapaz de ser hábil a mascarar a pequenez do interior. Os seus filmes (desde logo Colisão, Óscar em 2006) têm a existência de um ersatz. Na Terceira Pessoa, ainda por cima, nunca justifica porque é que as várias histórias, outras tantas formas de um escritor fazer a catarse de traumas e culpas (a morte, a infidelidade, o egoísmo), se passam em Paris, Nova Iorque, Roma — vê-se sempre com a desagradável sensação de que para Haggis Paris é a Torre Eiffel e Roma um submundo de ruas antigas de faca e alguidar. 
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