Estátua de D. Afonso Henriques na entrada de Viseu

Inauguração está marcada para o dia 24 de Abril. Iniciativa promovida por comissão popular que quer vincular a tese de que o primeiro rei nasceu em Viseu.

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Estátua vai ser instaladas sobre uma base em granito numa rotunda de Viseu Adriano Miranda

Uma estátua de D. Afonso Henriques vai ser colocada em Viseu a 24 de Abril. A escultura – em ferro – é da autoria do artista Augusto Tomás e a encomenda foi feita por uma comissão popular. A obra, que custou 20 mil euros, vai ficar na rotunda de uma das entradas da cidade. A inauguração deverá acontecer numa cerimónia que será assinalada de uma forma “singela”, conforme anunciou o porta-voz da comissão, Fernando Abreu.

A obra nasceu da vontade da população de oferecer a Viseu algo que vincule e reforce a ideia de que a cidade é o local de nascença de D. Afonso Henriques.

Esta tese surgiu depois de, em 1990, ter sido posta em causa a “tradição” de que Guimarães foi o “berço” do fundador da nacionalidade. Alguns especialistas têm vindo a defender uma tese avançada há 20 anos pelo historiador medievalista Almeida Fernandes, que editou a obra  Viseu, Agosto de 1109, nasce D. Afonso Henriques

Guimarães tem duas estátuas em homenagem ao rei fundador: uma de Soares dos Reis, que a produziu no final do século XIX e que está desde 1940 junto ao Paço dos Duques de Bragança e castelo; e outra mais recente, de João Cutileiro, inaugurada em 2001, no centro histórico.

“A iniciativa não é nenhuma desconsideração nem afronta (para com Guimarães), até porque não há nenhum historiador ou académico que consiga contrariar a tese de Almeida Fernandes”, argumenta Fernando Abreu.

A discussão sobre o lugar de nascimento de D. Afonso Henriques está no mesmo ponto em que estava há 5, 50, 60 ou 70 anos. “Não há nada que afirme, ou confirme, onde ele nasceu. Assim como não se pode dizer que nasceu em Guimarães, muito menos se pode dizer que nasceu em Viseu”, recorda António Amaro das Neves, historiador e presidente da Sociedade Martins Sarmento, com sede em Guimarães.

O professor não atribui significado especial à estátua que vai agora ser colocada em Viseu, cidade que até poderia ter “uma rua, uma praça ou outra coisa qualquer” com o nome do rei. “A única coisa certa é que Portugal começou a dar os primeiros passos com a Batalha de S. Mamede, isso é irrefutável”, acrescenta.

Para o historiador, nem a história nem a tradição dão como garantido o local de nascimento e, assim sendo, “onde falha a história, vai prevalecendo a tradição”.

A estátua esteve para ser colocada no ano passado, em Setembro, antes das eleições autárquicas, mas atrasos na execução da base adiaram o momento. “Gostávamos de contar com a presença do Dr. Fernando Ruas [ex-presidente da Câmara de Viseu] nesta homenagem que vamos agora fazer ao primeiro rei de Portugal, porque foi um defensor desta ideia”, admitiu o porta-voz.

Aquando da apresentação da obra, em Julho do ano passado, Fernando Ruas afirmou também que o facto de nenhum académico contrariar a tese de Almeida Fernandes era “suficiente para se aceitar que, de facto, foi Viseu a terra natal de D. Afonso Henriques, e dar isso como definitivamente conquistado". Declarações que foram contrariadas de imediato, nomeadamente pelo juiz desembargador jubilado Narciso Machado, que sustentou que “o local de nascimento de Afonso Henriques não se adquire por usucapião”.

Também Barroso da Fonte, o investigador e jornalista que liderou a contestação à teoria de Almeida Fernandes, tem afirmado não haver provas documentais que atestem que Afonso Henriques nasceu em Viseu. "Quando é assim, deve manter-se a tradição, que diz que Guimarães é o berço da nação e do primeiro rei de Portugal", defende.

A obra
O monumento é constituído por uma base de 5,5 metros em betão e revestido a granito sobre o qual será colocada a estátua feita de uma liga metálica dura (tipo malha de ferro). Nela, D. Afonso Henriques aparece com um corpo em forma de mapa de Portugal, mas sem a parte do Algarve - que ainda não tinha sido conquistado - e a empunhar uma espada com quase cinco quilos. Um escudo e um coração vermelho com a palavra Viseu nele inscrito são outros dos elementos da obra, que, para os criadores, simboliza também Viseu como o coração de Portugal.

A verba para a construção da estátua foi conseguida através de campanhas de angariação de fundos. “Queríamos que a sociedade civil fizesse parte deste projecto, porque este é um monumento do povo, para o povo e feito pelo povo”, disse Fernando Abreu.

O actual presidente da autarquia viseense considera também que esta é uma homenagem de iniciativa popular. “Encaro este gesto como uma homenagem de um grupo de cidadãos de Viseu ao primeiro rei, que o município acolheu ainda antes do meu exercício de funções, e que acarinhamos. Está para além de qualquer debate. Reforça a memória de D. Afonso Henriques numa cidade histórica”, disse Almeida Henriques (PSD).

O local de nascimento do primeiro rei de Portugal tem dividido historiadores e académicos. João Silva de Sousa, professor de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, é um dos defensores da tese de Almeida Fernandes, considerando que os documentos em que o medievalista se sustenta para assinalar Viseu como terra natal não deixam dúvidas.

Também Manuela Mendonça, medievalista e professora de História, anunciou que adoptava a tese de Almeida Fernandes. "Sabemos que há colegas que desde há muito comungam esta conclusão de Almeida Fernandes, que está absolutamente fundamentada em documentação e, na minha perspectiva pessoal, é inegável", frisou esta historiadora por altura do congresso internacional Afonso Henriques 900 anos depois, que se realizou em Viseu há cinco anos.

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