José Maria Ricciardi escutado seis vezes a falar com Passos Coelho

Para além de Passos Coelho, José Maria Ricciardi foi também escutado a falar sobre as privatizações da EDP e da REN com o ex-ministro Miguel Relvas.

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Num dos encontros com Passos Coelho, em Outubro de 2013, o governador do Banco de Portugal explicou que a solução teria de passar necessariamente pelo afastamento de Ricardo Salgado Daniel Rocha

O presidente do Banco Espírito Santo (BESI), José Maria Ricciardi, foi escutado não duas, mas seis vezes, a falar com o primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, informações que constam do processo Monte Branco, uma investigação policial relacionada com alegados crimes de tráfico de influências, corrupção e informação privilegiada nas privatizações da REN e da EDP.

A informação divulgada pelo Expresso consta do despacho de acusação contra jornalistas do Expresso, do Diário de Notícias e do Correio da Manhã, por violação do segredo de justiça, a propósito do processo Monte Branco.

O documento, que já não está em segredo de justiça, indica que entre Janeiro, Fevereiro e Julho de 2012, o primeiro-ministro e o presidente do BESI foram as escutados a conversar, estando os diálogos transcritos para papel e validados, a 19 de Outubro de 2012, pelo então presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Noronha do Nascimento.

Em causa está uma alegada tentativa de pressão do banqueiro sobre o primeiro-ministro, que não foi, segundo o Expresso, o alvo das escutas, nem é suspeito de qualquer crime sob investigação no MP.

Já José Maria Ricciardi é arguido no caso Monte Branco e no caso EDP/REN que resultou das investigações a Francisco Franco Canas.

A operação Monte Branco teve início em Junho de 2011. O Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), que investigou o circuito financeiro entre gestores de fortunas suíços e os seus clientes portugueses, e a utilização de contas do suspeito Francisco Franco Canas, em particular junto do BPN IFI, detectou a maior rede de sempre de fuga ao fisco e de branqueamento de capitais a operar em Portugal, com ligações à UBS, na Suíça.

O seu desmantelamento deu-se a 18 de Maio de 2012. Na sequência do processo Monte Branco, o DCIAP realizou buscas na Parpública [do Estado], no Caixa Banco de Investimento (Caixa BI) e no BESI, para apurar se houve ilegalidades no comportamento dos assessores financeiros do Estado nas privatizações da REN e da EDP.

Recorde-se que já a 14 de Outubro de 2012 o PÚBLICO revelara que o Ministério Público estava na posse gravações de conversas entre o então ministro dos Assuntos Parlamentares de Passos Coelho, Miguel Relvas, e José Maria Ricciardi, a propósito de negócios dependentes de Vítor Gaspar, então ministro das Finanças.

As escutas a Ricciardi, que surge, por vezes, como consultor de Passos Coelho, e a Relvas resultaram da recolha de informações (e não de recolha de provas) para ajudar a “desmantelar” o caso Monte Branco. Esta rede de fuga ao fisco e de branqueamento de capitais foi desmantelada a 18 de Maio de 2012 pelo Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP). Foram detidas várias pessoas, incluindo o cabecilha, Michel Canals.

Quando o PÚBLICO noticiou pela primeira vez a existências de escutas a Ricciardi sobre o caso Monte Branco, o banqueiro explicou: “Não sei o que possa ter dito de errado ao dr. Miguel Relvas.” E adiantou: “Provavelmente dei a minha opinião sobre o afastamento do BESI em favor da Perella, pois estava revoltado.”

Os contactos envolveram, nomeadamente, a privatização da EDP e o facto de Gaspar ter entregue à consultora Perella Weinberg a assessoria financeira da operação que era disputada pelo BESI.

Cinco dias depois, a 20 de Outubro, o Expresso revelou que Passos Coelho tinha sido “escutado fortuitamente no âmbito do processo Monte Branco”, tendo, na altura, Ricciardi emitido a seguinte nota: “Não configura ilicitude, irregularidade ou sequer censura o eventual protesto ou desabafo da minha parte perante membros da administração pública, destinado justamente a evidenciar a necessidade de garantir a transparência das regras do concurso e assegurar a igualdade de oportunidades facultadas aos concorrentes.”

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