O Inverno de Juan Carlos

Pela primeira vez na história da monarquia constitucional espanhola, um membro da família real poderá ser ouvido num tribunal, que confirmará ou não se a infanta Cristina é suspeita de fraude fiscal e branqueamento de capitais.

É mais um capítulo do "martírio", a expressão usada pelo chefe da Casa do Rei para descrever o "Caso Nóos", o imbróglio jurídico no qual estão envolvidos a infanta e o marido, Iñaki Urdangarin.

Profundamente abalada por este caso e pelo desgaste cada vez maior da imagem do rei Juan Carlos, a monarquia espanhola é uma instituição debilitada perante uma das maiores crises do regime democrático. Minado pelo impacto da crise económica e pelo desafio independentista da Catalunha, o Estado espanhol que saiu da transição em 1975 está em risco de soçobrar.

Os níveis de popularidade dos partidos do regime são os mais baixos de sempre. A degradação da monarquia, que foi o grande pilar da transição para um regime democrático e para o sistema das autonomias, não podia acontecer em pior altura. O regime precisa mais do que nunca do peso simbólico de uma instituição monárquica que se confunde com a figura do rei Juan Carlos e a monarquia está a ter cada vez mais dificuldades em desempenhar o seu papel de legitimação.

Este não é o momento de uma abdicação e muito menos de uma mudança de regime em Espanha. O monarca terá que travar sozinho um derradeiro combate para manter coeso um país em crise de confiança, descrente do projecto europeu e sem saber que papel o futuro lhe reserva.

E a situação da infanta perante a justiça tornou tudo mais difícil, quer ela venha ou não a ser ouvida. A monarquia joga o seu futuro neste último combate, do qual terá de sair em condições para preparar a sucessão e evitar uma crise constitucional de consequências imprevisíveis, nomeadamente para Portugal.

 
 
 

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