Hipótese de retirada total do Afeganistão ganha força em Washington

Última desavença com Karzai torna mais provável a opção de não deixar qualquer soldado no país após 2014. Taliban fecham delegação no Qatar

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Metade dos 63 mil soldados americanos devem deixar o Afeganistão até Fevereiro Omar Sobhani/Reuters

Não é a primeira vez que a hipótese é avançada, mas a notícia de que a Administração norte-americana está a ponderar seriamente a possibilidade de acelerar a retirada militar do Afeganistão e não deixar qualquer soldado no país após 2014 mostra até que ponto o boicote do Presidente Hamid Karzai às negociações com os taliban enfureceu Washington, azedando um pouco mais as relações entre os já desavindos aliados.

Os EUA têm 63 mil soldados no Afeganistão e, segundo o actual calendário, quase metade deve deixar o país até Fevereiro próximo, no âmbito de uma retirada que deverá concluída até ao final desse ano. Washington pretende, no entanto, manter uma pequena força no país para lá dessa data (fala-se em oito mil soldados com a missão de perseguir a Al-Qaeda na região), e há meses que negoceia as condições com Cabul.

Mas as atribuladas discussões foram suspensas por Karzai em Junho, em protesto contra a abertura de uma delegação dos taliban no Qatar — um espaço que deveria servir para as negociações de paz, mas que os rebeldes transformaram numa espécie de embaixada do “governo afegão no exílio”. Furioso, o Presidente afegão decidiu também não enviar delegados a Doha, levando os EUA a adiar as conversações com os taliban.

Nesta terça-feira, o New York Times revelou que, a 27 de Junho, o Presidente norte-americano, Barack Obama, falou através de videoconferência com Karzai, mas a conversa terminou mal. Citando fontes americanas e afegãs, o jornal conta que Karzai acusou Washington de excluir o seu Governo das negociações com os taliban e com os seus aliados paquistaneses, deixando-o “exposto aos seus inimigos”. A acusação não é nova, mas nunca o Presidente afegão a terá dito na cara de Obama que, segundo o NY Times, terá respondido que “muitos soldados americanos morreram a defender o Governo” afegão.

Depois disso, a opção de não deixar qualquer militar americano no Afeganistão após o fim do mandato da NATO deixou ser o “pior desfecho possível” para as negociações com Cabul, transformando-se “numa alternativa que está a ser seriamente ponderada”, escreve o jornal, sublinhando, no entanto, que nenhuma decisão foi ainda tomada quer sobre o ritmo da retirada quer sobre o cenário pós-2014.

A Casa Branca não comentou a notícia — que a tornar-se verdade repetiria o que aconteceu no Iraque, em 2011 — e um alto responsável afegão ouvido pela Reuters disse que a hipótese não passa de uma forma de os EUA pressionarem o Afeganistão, tanto mais que as duas partes “compreendem que a presença de tropas estrangeiras é vital para a segurança do país e da região” a longo prazo.

Entretanto, num novo revés nos planos norte-americanos para a saída do Afeganistão, os taliban anunciaram que vão encerrar “temporariamente” a delegação no Qatar, acusando Washington, Cabul e o Qatar de “não terem cumprido as promessas que foram feitas”.

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