Perfil: a diva dos pés descalços

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Cesária Évora começou em Paris uma carreira tardia Daniel Rocha

A cantora cabo-verdiana Cesária Évora morreu, aos 70 anos, no Hospital Baptista de Sousa, na ilha de São Vicente, Cabo Verde, por “insuficiência cardio-respiratória aguda e tensão cardíaca elevada”.

A “diva dos pés descalços”, como a imprensa se referiu muitas vezes a Cesária Évora, nasceu há 70 anos na cidade do Mindelo, na ilha cabo-verdiana de S. Vicente, no seio de uma família de músicos.

Numa das muitas entrevistas que deu, certa vez afirmou: “Tudo à minha volta era música”. O pai, Justiniano da Cruz, tocava cavaquinho, violão e violino, instrumentos que se tornaram característicos daquelas ilhas, o irmão, Lela, saxofone, e entre os amigos contava-se o mais emblemático compositor cabo-verdiano, B. Leza.

Cize, como era carinhosamente tratada pelos amigos, tornou-se no nome mais internacional de Cabo Verde, país de onde o mundo conhecia já grandes músicos como Luís Moraes e Bana.

Desde cedo que Cesária Évora se lembrava de cantar, como referiu numa das muitas entrevistas que deu: “Cantava ao ar livre, nas praças da cidade, para afastar coisas tristes”. Aos 16 anos, canta nos bares da cidade e nos hotéis, começando a ganhar uma legião de fãs que a aclamavam já como “rainha da morna”.

A independência da nação africana, em 1975, coincide com o início de um “período negro” da cantora, que deixa de cantar, tem problemas com o alcoolismo e trabalha noutra área.

Em 1985, a convite de Bana, proprietário de um restaurante e uma discoteca com música ao vivo em Lisboa, Cize vem a Lisboa e grava um disco que passou despercebido à crítica, seguindo para Paris onde é “descoberta” e daqui, como aconteceu com outros cantores, partiu para os palcos do mundo.

Em 1988, grava “La diva aux pied nus”, álbum aclamado pela crítica. Nesta fase da sua carreira, tem um papel fundamental, que se manteve até ao final, o empresário francês José da Silva.

Em 1992, Cesária Évora gravou “Miss Perfumado” e aos 47 anos torna-se uma “estrela” internacional no mundo da world music, fazendo parcerias com importantes músicos e pisando os mais prestigiados palcos.

Uma carreira internacional que passou várias vezes por palcos portugueses cujas salas esgotavam para ouvir, entre outros êxitos, “Sôdade”.

Em 2004, recebeu um Grammy para o Melhor Álbum de world music contemporânea, pelo disco “Voz d’Amor”. Cize não pára e continua em sucessivas digressões, regressando de quando em vez à sua terra natal.

“Eu preciso de quando vez da minha da terra, do povo que sou e desde marulhar das ondas”, confidenciou certa vez à Lusa.

A cantora começa a enfrentar vários problemas de saúde e alguns “sustos”, como afirmava, mas regressava sempre aos palcos e aos estúdios com alegria.

Em 2009, o Presidente francês Nicolas Sarkozy entrega-lhe a medalha da Legião de Honra, depois de uma intervenção cirúrgica que a levou a temer pela vida.

Cesária voltou aos estúdios e anunciou não só uma digressão, como a gravação de um novo disco, que deveria sair no próximo ano.

No dia 24 de Setembro, numa entrevista ao Le Monde, a cantora afirma que tem de terminar a carreira por conselho médico. A sua promotora, Tumbao, emite um comunicado confirmando as declarações da “diva dos pés descalços” e dando conta da tristeza que sentia por ter de o fazer.

Nesse mesmo dia, ao princípio da tarde, a cantora é internada no hospital parisiense de Pitie-Salpetriere, por ter sofrido mais um acidente vascular cerebral (AVC). A Tumbao emitiu nesse mesmo dia um comunicado, dando conta de que o diagnóstico clínico da mais internacional artista cabo-verdiana era “reservado”.

Aos 70 anos, completados no passado 27 de Agosto, e após uma curta visita a Lisboa, onde pediu para passear a pé pelo bairro de São Bento, Cesária Évora morreu em Cabo Verde.

Ao longo da carreira, além das inúmeras digressões e actuações em televisões, gravou 24 álbuns, um DVD, “Live in Paris”, e registou dezenas de colaborações em discos.

Notícia substituída às 18h48
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