Lei do recibo electrónico de renda vai ser enviada ao Constitucional

Associação de proprietários vai pedir inconstitucionalidade das novas regras, que entram em vigor já em Maio, alegando que são discriminatórias. Governo garante que portaria está dentro da legalidade.

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Mais de meio milhar de contratos de arrendamento está registado electronicamente. Paulo Ricca

A Associação Nacional de Proprietários (ANP) vai pedir de inconstitucionalidade da lei que impõe a obrigatoriedade de emissão electrónica das rendas acima dos 70 euros mensais (838,44 euros), para proprietários com idade inferior a 65 anos, com base na discriminação de cidadãos. A ANP contesta ainda a desconformidade entre o que é exigido na lei da reforma do IRS e a Portaria nº 98-A/2015, de 31 de Março, que regula os recibos electrónicos de renda, também chamados de “recibos verdes de renda”.

António Frias Marques, presidente da ANP, explicou ao PÚBLICO que “o pedido de inconstitucionalidade, que está a preparar, se baseia na discriminação de cidadãos, adiantando que há muitos proprietários com menos de 65 anos e que não estão familiarizados com os meios electrónicos, nem têm meios disponíveis, enquanto outros com mais de 65 anos podem estar habilitados para o fazer”. O responsável lembra ainda que a discriminação em causa contrária à declaração dos direitos dos homem, que Portugal assinou.

Frias Marques adianta que a associação vai decidir esta quinta-feira, em reunião com o departamento jurídico, a forma de pedir a inconstitucionalidade, que não pode pedida directamente pelos proprietários. Entre outros, podem pedir a fiscalização da constitucionalidade e da legalidade de uma norma o Presidente da República, o provedor de Justiça e um décimo dos deputados da Assembleia da República.

Ao contrário da inconstitucionalidade reclamada pela ANP, o secretário de Estados dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio, garante a legalidade da norma relativa ao tratamento diferenciado dos cidadãos em função da idade e, na questão da conformidade da portaria, explica que trata-se de “uma densificação de um lei que já aconteceu outras vezes, como nos recibos verdes”.

A emissão electrónica, que está a gerar forte contestação por parte dos proprietários, passa a ser obrigatória a partir de Maio e com retroactividade a Janeiro, passando depois a ser mensal. 0s proprietários alegam que a portaria contraria a lei da reforma do IRS, que permite aos proprietários a opção entre a emissão electrónica ou a apresentação de uma declaração em papel em Janeiro de cada ano (modelo 44). Já a portaria impõe exigências mais apertadas a partir de rendas mensais de 70 euros e discrimina os cidadãos em face da idade.

A portaria isenta da obrigatoriedade de emissão electrónica apenas os proprietários com mais de 65 anos ou os contratos de arrendamento rural. Estes proprietários podem apresentar a declaração anual. O secretário de Estado lembra que, em caso de impedimento, a portaria permite que o proprietário possa indicar um outra pessoa ou entidade para fazer a emissão do recibo. Para o governante, “as declarações dos proprietários traduzem o grande nervosismo pelas novas alterações que pretendem combater o arrendamento clandestino e a evasão fiscal que acontece neste campo”.

A emissão electrónica terá de ser realizada através de uma espaço a criar no Portal das Finanças, onde os senhorios entrarão com a sua palavra passe para preencher e enviar o recibo. Os recibos terão ainda de ser impressos em duplicado (um para entregar ao inquilino e outro para guardar). Tal como acontece actualmente com as declarações de IRS e tal como está previsto na reforma deste imposto, António Frias Marques defende que a emissão electrónica de recibos de rendas deve ser uma opção, mantendo a possibilidade de apresentação de uma declaração anual.

O presidente da ANP diz que a exigência electrónica também levanta problemas quando existe mais do que um proprietário do prédio arrendado e em situações de heranças não concluídas – dúvidas que já colocou à Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), mas para as quais ainda não obteve resposta. Paulo Núncio garantiu ao PÚBLICO que até ao final do mês serão publicados esclarecimentos sobre o processo.

Na portaria que institui a emissão electrónica, a AT sustenta que as novas medidas visam a “crescente desmaterialização e simplificação no cumprimento das obrigações fiscais, sem encargos, a par com o esforço dos mecanismos de controlo, contribuindo para a redução dos níveis de incumprimento e de evasão fiscal”.

Em contrapartida, a ANL e a Associação Lisbonense de Proprietários (APL) estão preocupadas com as dificuldades acrescidas que muitos proprietários vão sentir e receiam pelas penalizações que possam ser aplicadas em caso de incumprimento. As duas associações, que não contestam a necessidade de maior controlo, têm reforçado o apoio aos associados. A ALP acaba de criar um serviço especializado para dar resposta ao elevado número de solicitações e dúvidas que lhe chegam desde a publicação das novas regras. A associação também está a oferecer a possibilidade de se substituir mensalmente os proprietários naquela obrigação.

As mediadoras imobiliárias, que habitualmente já fazem a gestão de rendas, têm nesta exigência uma nova fonte de receitas (custos para os proprietários). Ainda assim, também se mostram preocupadas com os problemas que possam surgir. Luís Lima, presidente da APEMIP, a associação das empresas de mediação, pede a criação imediata de condições que permitam um acesso indirecto das mediadoras ao Portal das Finanças, porque diz não acreditar que os proprietários passem a fornecer a sua senha fiscal, e sem isso não é possível fazer a emissão de recibos. 

Notícia actualizada com informação relativa ao procedimento de pedido de inconstitucionalidade de uma norma.

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